segunda-feira, 7 de março de 2022

[Modelo] Processo Civil/Direito Público - Contestação em ação de ressarcimento de danos por ato de improbidade administrativa

 Ao Juízo de Direito da 0ª Vara Cível da Comarca de [nome do município] – Estado de São Paulo.

 

 

Processo nº 0000000-00.0000.8.26.0000

 

[Nome do réu], parte já qualificada nos autos do feito em epígrafe, que tramita por essa E. Vara e respectivo Ofício Judicial, em que lhe move o MUNICÍPIO DE [nome do município], parte também qualificada, por denunciação da lide feita pela parte requerida [nome do litisconsorte], que também está devidamente qualificada, por seu advogado infra-assinado, vem, respeitosamente à presença de Vossa Excelência para apresentar CONTESTAÇÃO, o que faz na forma a seguir e segundo os elementos de fato e de direito abaixo apresentados:

 

1. Dos fatos

 

O município de [Nome do município] está promovendo ação de perdas e danos, originalmente proposta em desfavor do ex-prefeito [nome do litisconsorte].

Alega a municipalidade, que o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo julgou irregulares os aditivos feitos no contrato existente entre a Prefeitura e a empresa [nome da empresa], para o fornecimento de merenda escolar no município no ano de 2.001 (contrato original) e com aditivos nos anos de 2.003, 2.004 e 2.005.

Por tal julgamento, houve a comunicação do Ministério Público da Comarca de [nome da comarca], que instaurou inquérito civil[1] e, ao final concluiu que a Prefeitura deveria propor ação de ressarcimento em desfavor dos responsáveis, razão pela qual solicitou essa providência judicial.

Em apertada suma foram constadas as seguintes irregularidades, conforme vemos na cópia das próprias alegações inaugurais:

“[...] nos termos 01/03, 01/04 e 12/05 não há comprovação da obtenção de preços e condições mais vantajosas para a Administração; no termo nº 04/06 foi utilizado índice para reajuste superior ao índice acordado, que era o IGPM, sendo que se fosse utilizado tal índice acumulado dos 12 meses anteriores o aditivo sofreria uma redução da ordem de R$ 234.339,00; Que, pelo que se verifica, sendo irregulares o procedimento licitatório e o contrato dele advindo, pelo princípio da acessoriedade também são considerados irregulares os aditivos posteriores; Que referidos aditivos, em tese, foram irregulares e causaram prejuízo ao erário;”

Em relação ao valor dos danos, apurou a autora que atualmente o seu valor importa em R$ 17.465.913,72 (dezessete milhões, quatrocentos e sessenta e cinco mil, novecentos e trezes reais e setenta e dois centavos), pretensão deduzida nos pedidos feitos na petição inicial.

Ao contestar a ação, o requerido [nome do litisconsorte] assumiu eventual responsabilidade pelas supostas ilegalidades apresentadas na petição inicial até o dia 00/00/0000, pois teve seu mandato cassado, assumindo então o mandato, por ordem judicial, a parte que ora contesta a ação, Sr. [nome do réu], que exerceu mandato até o dia 00/00/0000 e a partir do dia 01/01/0000 assumiu a parte [nome de outro litisconsorte passivo].

A Prefeitura Municipal, bem como o Ministério Público não se opuseram à denunciação da lide, contudo não apresentaram qualquer fundamento para suas concordâncias, o que inicialmente já demonstra uma profunda injustiça contra o réu que ora contesta a ação.

É a breve exposição dos fatos de interesse ocorridos na marcha processual.

 

2. Da contestação

 

2.1. Esclarecimentos iniciais necessários

 

Esclarece-se inicialmente que o requerido [nome do réu que contesta a ação] exerceu mandato eletivo por um curto período, ou seja, de 00/00/0000 a 00/00/0000, em razão da cassação de seu antecessor [nome do antecessor].

Já é dos autos (Fls. 0000) essa prova e, nesse período, nenhum documento, contrato, aditamento, enfim, nenhum ato de formação, modificação ou criação de obrigações jurídico-pecuniárias para a Prefeitura Municipal de [nome do município] foi praticado pelo requerido que ora contesta a ação.

Devido a essas premissas, a presente contestação se desenvolve a seguir, de forma a demonstrar não só os problemas técnicos que atingem essa ação, bem como demonstrando os motivos de mérito que a elevam a uma situação teratológica.

 

2.2. Das preliminares de mérito

 

2.2.1. Da inépcia da petição inicial e da denunciação da lide em relação ao requerido [nome do réu que contesta a ação]

 

Tanto a denunciação da lide, fato processual que provocou a inserção do requerido [Nome do réu que contesta a ação] no polo passivo da ação, quanto a petição inicial, não se amoldam aos critérios contidos no inciso III, do artigo 319 do Código de processo civil, abaixo transcrito:

“Art. 319.  A petição inicial indicará:

[...]

III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido;” (grifo do subscritor)

Como se nota na petição de denunciação da lide, seu fundamento está apenas na mera alegação do exercício do mandato pelo requerido [nome], não apontando onde infringiu a lei, tampouco descrevendo que conduta sua poderia ser considerada ato que pudesse ser tido como danoso ao erário e passível de ressarcimento.

Se Vossa Excelência compulsar os autos, não encontrará qualquer fato, prova, fundamento ou mesmo uma versão que pudesse ser considerada, apresentada por qualquer das partes (autora e denunciante).

É incrível que a autora tenha concordado com a denunciação da lide e igualmente inacreditável que o Ministério Público tenha seguido o mesmo caminho, o que demonstra que nenhuma dessas partes (Denunciante, autora e MP) analisou a contento o processo e, por essa falha, todos os responsáveis devem responder pela condenação em custas e honorários advocatícios.

É impossível que essa ação continue da forma que está, pois não aponta a conduta que é ilegal e com isso prejudica até mesmo a defesa, cerceando-a.

Por outro ângulo, vemos também que a decisão que acolhe a denunciação da lide não traz qualquer fundamento, o que ofende frontalmente o artigo 93, inciso IX da Constituição Federal, que segue a baixo transcrito:

“Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

[...]

IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes;” (grifo proposital do subscritor)

Uma reflexão mínima sobre a decisão que acolheu o pedido de denunciação da lide, demonstra que não se sabe o motivo do pedido, tampouco do acolhimento, o que é processualmente inadmissível e põe a decisão sob o crivo da nulidade, que no caso se opera de pleno direito e resta prequestionada, para fins de recurso especial.

Por isso, outro caminho processual não é possível, senão a extinção do processo, sem julgamento do mérito, em relação ao requerido que ora contesta a ação, nos termos do artigo 485, incisos I e IV do Código de processo civil[2], condenando-se a autora, o denunciante e o Estado, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, na forma preconizada em lei e de forma solidária, pois essas partes são responsáveis por seu ingresso no polo passivo do processo.

 

2.2.2. Da Ilegitimidade de parte

 

Neste caso é difícil entender o motivo da denunciação da lide do requerido [nome  do réu que contesta a ação], bem como o motivo de sua aceitação por parte da autora bem como do Ministério Público.

O requerido [nome de um dos dois litisconsortes passivos], com o simples fato do requerido [nome do réu que contesta a ação] ter assumido um mandato de forma repentina, que durou aproximadamente X (número por extenso) meses, em razão de sua cassação, denunciou à lide aquele requerido, mas não fundamentou suas razões.

O Ministério Público e a autora também concordaram, mesmo ausente qualquer fundamentação do justo motivo da denunciação da lide ou das aceitações, tampouco de uma apuração prévia da responsabilidade do Requerido que ora contesta a ação.

Apenas para que se permita a argumentação a respeito, se existisse qualquer responsabilidade do requerido que ora contesta a ação, seria de 00/00/0000 a 00/00/0000, ou seja, apenas pelo período correspondente à duração do mandato eletivo.

Nesse interregno, o requerido que ora contesta a ação não realizou nenhuma contratação, tampouco aditamentos contratuais, ou seja, nenhum ato jurídico que alterasse a situação.

Não bastasse isso, quando assumiu a Prefeitura Municipal, o requerido que ora contesta a ação manteve em andamento, até para não recair no ilícito, a execução de todos os contratos que a Prefeitura participava e apresentavam aparente e presumida legalidade.

Não se vê na petição inicial, na denunciação da lide ou em qualquer parte deste processo, o nome do Requerido que ora contesta a ação como praticante de qualquer avença jurídica na condição de Prefeito, na época que exerceu o mandato de Prefeito, com a empresa [nome da empresa que participa do polo passivo da ação].

Não existe qualquer fundamento jurídico/legal que sustente a participação do requerido que ora contesta a ação, no polo passivo desta ação, que aliás, em relação ao mesmo é inepta.

Além de não existir fundamentação técnica na petição inicial ou mesmo na denunciação da lide, nem documentos que comprovem atos ímprobos ou lesivos do requerido que ora contesta a ação, de rigor sua exclusão do polo passivo da ação, pois isso não se justifica de qualquer forma.

Pelo exposto, como ao final se requer, deve o requerido que ora contesta a ação, ser excluído o polo passivo da ação, com a condenação das partes que requereram e concordaram com a denunciação da lide, condenando-se a autora, o requerido [nome do litisconsorte que requereu a denunciação da lide] e o Estado (que responde pelo Ministério Público), que paguem as custas processuais e honorários advocatícios sobre o valor da causa devidamente corrigido.

A condenação em custas e honorários se justifica porque todas as partes tiveram condições de verificar a inexistência de apuração, provas e fatos contra esse requerido, pois não era suficiente, apenas, ter exercido mandato de Prefeito por um período, mas sim a apuração subjetiva da situação.

 

2.2.3. Do valor da causa – ofensa ao às regras do artigo 292 e ao artigo 37 da Constituição Federal

 

É expresso da petição inicial que o valor dado à causa é de R$ 10.000,00 (dez mil reais), contudo vemos que a pretensão é brutalmente maior, razão pela qual é uma tentativa de fraude tal denominação do valor da causa.

Também é expresso, e bem expresso, que o valor apurado pela autora Prefeitura Municipal de [nome do município] sobre a alegação dos supostos danos cobrados, chegam ao valor de R$ 25.465.913,72 (vinte e cinco milhões, quatrocentos e sessenta e cinco mil, novecentos e trezes reais e setenta e dois centavos).

Na lógica jurídica contemporânea, não existem parâmetros que fundamentem uma disparidade tão superlativa entre o que se pretende em uma ação e o que é declarado como valor perseguido.

Dos artigos 292 do Código de processo civil, em seus incisos I e V, constam os parâmetros legalmente válidos para a atribuição do valor da causa, o que vemos abaixo ipsis literis:

“Art. 292.  O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será:

I - na ação de cobrança de dívida, a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data de propositura da ação;

[..]

V - na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; [...]”

Dentro do modelo atual de atribuição do valor da causa, não encontramos validade, legalidade ou lógica para a atribuição do valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para uma causa que persegue declaradamente mais de R$ 25.000.000,00 (vinte e cinco milhões de reais).

Nem se fale que a Prefeitura não possuía condições de, ao menos, se chegar a um valor estimado, que aliás foi apresentado na petição inicial. O pedido de perícia não é impeditivo para a estimativa do valor da causa, que de fato e processualmente foi feita com a declaração do valor que se entende devido.

Tanto é verdade que apresenta planilha de débito às fls. 000 do autos, o que destoa da regra legal para a atribuição do valor da causa, ficando nítido que se trata de uma manobra jurídica para que não sejam recolhidas as custas realmente devidas ao Poder Judiciário, ou seja, uma fraude escancarada.

Também não é certo dizer que a autora não possui meios de apuração, pois possui Departamento de Finanças, Procuradoria, o que lhe dá toda a estrutura para apurar danos a si própria, sendo inadmissível se falar em perícia para a apuração dos supostos danos.

O caput do artigo 37 da Constituição Federal[3] é claro ao impor a estrita obediência ao princípio da legalidade, eficiência e principalmente da moralidade e a Prefeitura não se pode dizer inapta a apurar situação por simples cálculos aritméticos.

A atribuição do valor da causa não seguiu o princípio da legalidade, pois afrontou a regra legal, de forma frontal e evidente.

O princípio da eficiência também foi ofendido, pois dentro dessa base principiológica, obedecer a lei é ser eficiente.

A moralidade então, acredita-se que foi o princípio mais ofendido, pois falar uma coisa e fazer outra, ou seja, querer um valor e declarar outro no valor da causa é ato ímprobo.

Na verdade o entrelaçamento dos princípios da administração pública, notadamente no que tange ao obedecimento de seus princípios básicos fazem com que uma só conduta ofenda várias regras, o que não pode ser tolerado e o ato aqui atacado é único, mas ofende a lei e os princípios já invocados.

Mesmo o Ministério Público agiu com ineficiência, pois como custos legis deveria impedir que situações assim ocorram nas “barbas” da Justiça, uma vez que deveria ter visto o tamanho da pretensão, ainda que estimada, e sua disparidade com o valor da causa.

É fraude sim! Saber, inequivocadamente que o valor da causa é um e a pretensão é literalmente milhões de vezes maior não é moral, não é legal e não pode, tampouco será aceito sem luta, pois se trata de um ilícito administrativo e judicial.

Isso é litigância de má-fé, pois altera a verdade dos fatos!

Por tais razões, fica evidente que a autora quer se locupletar praticando a fraude de não atribuir corretamente o valor da causa, é vergonhoso.

Por tais razões, Vossa Excelência deve determinar à autora que emende a petição inicial para que atribua o valor correto à causa no importe de seus próprios cálculos (fls. 00), no importe de 25.465.913,72 (vinte e cinco milhões, quatrocentos e sessenta e cinco mil, novecentos e treze reais e setenta e dois centavos), pois se não é o valor certo, é ao menos a estimativa, que decorre de cálculos aritméticos feitos por um ente público e, recolha as custas processuais faltantes, inerentes a tal pretensão.

 

2.3. Da contestação de mérito

 

Caso as teses de mérito não prosperem, o que não é sequer cogitado em via do suporte legal invocado, outras razões se incorporam à defesa de forma a demonstrar cabalmente que o requerido que ora contesta a ação está sendo vítima de uma visão jurídica míope e injusta por parte do requerido que o denunciou à lide, da autora e do Ministério Público.

 

2.3.1. Da atuação do requerido que contesta a ação em relação aos instrumentos contratuais considerados ilegais

 

Como já explicado, o requerido que ora contesta a ação exerceu um curto mandato de aproximadamente X (número por extenso) meses, que ocorreu devido ao fato que o requerido e litisconsorte passivo [nome do litisconsorte passivo].

Dessa forma, quando assumiu o cargo de Prefeito, o requerido [nome], como determina o princípio da legalidade, manteve todos os negócios jurídicos em que não existiam indícios aparentes de ilegalidade.

Assim, manteve o contrato com a empresa vencedora do certame licitatório, até mesmo porque não existia nenhuma reclamação sobre a qualidade da merenda ou mesmo a impontualidade ou qualquer notícia que colocasse tal contrato sob suspeita.

De mais a mais, não era possível na época, a realização de novo certame para o fornecimento de merenda, mesmo se o requerido que ora contesta a ação assim desejasse, sob o sério risco de ocorrer paralização do fornecimento de merenda escolar, o que seria inadmissível, devido ao curto espaço de tempo que exerceu o mandato eletivo.

Na época, o requerido que ora contesta a ação encontrou muitas irregularidades que necessitavam ser sanadas, mas todas ilegalidades que sanou eram aparentes, pois é praticamente impossível detectar ilegalidades veladas por uma falsa presunção de legalidade, o que induz, engana.

Já temos mais uma boa noção da injustiça que essa ação representa contra o requerido que ora contesta a ação.

 

2.3.2. Da presunção de legalidade da licitação e aditivos

 

Também depreende-se dos autos, que o contrato e os aditivos questionados foram licitados e sua ilegalidade só foi suscitada em decisão do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TC-000000/000/00), em apuração que aconteceu apenas após o término do mandato “tampão” do requerido que ora contesta a ação.

Assim, sem qualquer elemento que indicasse qualquer irregularidade, logicamente prevaleceria a presunção de legalidade da licitação e do aditivo anteriores ao seu mandato, pois a contratação da empresa que fornecia Merenda Escolar decorreu de um processo licitatório que contou com assessoria técnica, bem como ocorreu do aditamento anterior a maio de 0000 e se presumia obediente à legislação.

Na doutrina e jurisprudência já resta consagrado que os atos administrativos gozam de presunção de veracidade e legalidade, o que resta demonstrado nos julgados abaixo:

“RECURSO ESPECIAL Nº 1.372.165 - SC (2013/0061181-9) RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES RECORRENTE : MOBRA SERVIÇOS DE VIGILÂNCIA LTDA ADVOGADOS : JOÃO DE BONA FILHO E OUTRO (S) MATEUS SPANEMBERG DA SILVA RECORRIDO : FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE REGIONAL DE BLUMENAU - FURB ADVOGADO : CÉSAR AUGUSTO WOLFF E OUTRO (S) RECORRIDO : ORSEVIG ORGANIZAÇÃO DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA LTDA ADVOGADO : ISIDRO TADEU XAVIER DE LIMA E OUTRO (S) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. AFASTAMENTO DA MULTA PROTELATÓRIA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 283/STF. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADO. DECISÃO Trata-se de recurso especial interposto com fundamento na alíneas a e c do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal/1988, contra acórdão proferido pelo TJSC assim ementado (e-STJ fl. 445): CONSTITUCIONAL - ADMINISTRATIVO - LICITAÇÃO - MODALIDADE MENOR PREÇO - IMPUGNAÇÃO À PLANILHA DE FORMAÇÃO DE CUSTO DA EMPRESA CONSIDERADA VENCEDORA - TESE DE INEXEQUIBILIDADE DA PROPOSTA - PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS - RECURSO DESPROVIDO "Tendo a licitação por objeto a 'contratação de serviços de vigilância patrimonial' na modalidade 'menor preço', somente a existência de provas ou de fortes indícios de ser inexequível a proposta formula da pela empresa vencedora autorizaria a suspensão do contrato celebrado. Assim deve ser porque: a) em favor dos atos administrativos milita presunção de legitimidade (Celso Antônio Bandeira de Mello, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Hely Lopes Meirelles) e supõe-se que 'as decisões da administração são editadas com o pressuposto de que estão conformes às normas legais e de que seu conteúdo é verdadeiro (Odete Medauar)" (ACMS n. 2007.000132- 6, Des. Newton Trisotto). Salvo se evidente a afronta aos princípios da licitação - legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento convocatório, julgamento objetivo - e ao da moralidade administrativa, deve ser prestigiada a decisão da Comissão de Licitação, que se presume convergente com o interesse público. Os dois embargos de declaração opostos foram rejeitados, sendo que no último houve condenação ao pagamento de multa. Nas razões do recurso especial, a parte recorrente aponta violação dos arts. 17, V e VI, 18 e 535 do CPC, 3º, caput, 41, caput, 43, V, 44, caput, e 45, § 1º, I, da Lei n. 8.666/93 bem como dissídio jurisprudencial. Alega, em síntese, os seguintes pontos: (i) necessidade de afastamento da multa por litigância de má-fé, considerando que os segundos embargos de declaração opostos tiveram o propósito de prequestionamento; (ii) anulação do acórdão recorrido por não sanar as omissões indicadas nos embargos de declaração; (iii) o entendimento do Tribunal de origem no sentido de que a existência de erros na planilha de custos e formação de preço só deve ser considerada caso importe em inexequibilidade da proposta contraria os princípios da isonomia e da vinculação ao instrumento convocatório. Não foram apresentadas contrarrazões. Parecer do MPF às fls. 571/575 (e-STJ), opinando pelo conhecimento parcial do recurso e, nessa extensão, pelo provimento. É o relatório. Passo a decidir. A insurgência merece prosperar em parte. Primeiramente, não conheço da violação ao art. 535 do CPC, pois as alegações que fundamentaram a pretensa ofensa são genéricas, sem discriminação dos pontos efetivamente omissos, contraditórios ou obscuros. Incide, no caso, a Súmula n. 284 do Supremo Tribunal Federal, por analogia. De outro lado, a multa aplicada nos embargos declaratórios deve ser afastada na espécie, visto que embargos de declaração manifestados com propósito de prequestionamento não tem caráter protelatório, nos termos da Súmula 98 do STJ. No mérito, dessume-se dos autos que o Tribunal de origem entendeu que a despeito da existência de erros na proposta apresentada pela recorrida, tal não compromete o princípio da igualdade entre os licitantes, considerando que: (i) o preço global da proposta não está fora dos padrões de mercado; (ii) o contrato já foi assinado e os serviços estão sendo prestados desde junho de 2008; (iii) a proposta não é inexequível. Ocorre que tal conclusão, não foi impugnada, de forma específica, pelo recorrente, o que atrai a incidência, por analogia, da Súmula 283/STF. Por fim, não há como conhecer do dissídio jurisprudencial suscitado, por não haver a necessária similitude fática entre os arestos colacionados, descumprindo, portanto, os termos dos arts. 255, § 2º, do RISTJ e 541, parágrafo único, do CPC. De fato, a parte litigante não demonstrou que o aresto recorrido e os paradigmas possuem as mesmas molduras fáticas, a ponto de reclamarem a mesma solução jurídica, sendo, assim, inadmissível a insurgência quanto à alínea c. Diante dessas considerações, com base no art. 557, § 1º-A, do CPC, conheço parcialmente do recurso especial e, nessa parte, DOU-LHE PROVIMENTO apenas para afastar a multa protelatória. Publique-se. Intimem-se. Brasília (DF), 15 de outubro de 2014. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES Relator (STJ - REsp: 1372165 SC 2013/0061181-9, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Publicação: DJ 21/10/2014)”

MANDADO DE SEGURANÇA – Anulação de multas e suspensão de procedimento administrativo – Milita em favor dos atos da Administração Pública presunção de legitimidade, que só pode ser desconstituída por prova em contrário, ônus que incumbe a quem alega o fato negativo – Recursos providos. (TJ-SP - APL: 10054892520148260482 SP 1005489-25.2014.8.26.0482, Relator: Luiz Sergio Fernandes de Souza, Data de Julgamento: 28/09/2015, 7ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 07/10/2015)

Diante desses posicionamentos, vemos que é impossível atribuir qualquer responsabilidade ao requerido que ora contesta a ação, já que não praticou nenhum ato ilícito e manteve a execução do contrato por necessidade e presunção de sua legalidade em razão dos procedimentos administrativos da licitação e de pareceres técnicos que embasaram os termos aditivos, além da inexistência de ilegalidade aparente.

Se, tanto o denunciante, como a autora e o Ministério Público tivessem analisado os autos a contento, ficaria evidente a falta de qualquer ato culposo ou doloso do requerido que ora contesta a ação, que na verdade foi induzido a pensar que o contrato e seus aditivos obedeciam à legislação.

Nem se diga que o questionamento sobre as ilegalidades são sutis, não evidentes à observação simples, o que torna ainda mais absurda a denunciação da lide e a aceitação sem critérios por parte da autora e do Ministério Público que deveriam ser mais prudentes, no mínimo, para não dizer irresponsáveis.

Como pensar que uma pessoa que não sabia de um fato possa responder juridicamente por ele?

Como pensar que uma pessoa que desconhecia qualquer ilegalidade poderia ser acusada de praticar qualquer ato ilegal sem saber da ilegalidade?

Isso se assemelharia ao fato de uma acusação em desfavor do Ministério Público, por atitude ilícita devido ao fato de não ter processado os criminosos que não foram identificados ainda!

A falta de lógica e de falta de nexo causal entre os danos praticados e seu causador, no que se refere à inserção do requerido que ora contesta a ação no polo passivo da ação, impedem que se conclua contra ele, qualquer ilícito.

O silogismo apresentado para justificar a inserção do requerido que ora contesta a ação no polo passivo “exerceu mandato, logo também é responsável” é defeituoso, um sofisma ignóbil.

A desconstrução da falácia está no fato que o responsável é quem praticou e sabia das ilegalidades e não quem apenas exerceu mandato eletivo, tentativa frágil de deturpar a verdade.

Essas razões são imperativas e impõem o rigor da improcedência da ação, em desfavor do requerido que ora contesta a ação, pois caso contrário estaríamos diante de um non sense jurídico e um evidente error in judicando.

 

2.3.3. Da não configuração de ato de improbidade administrativa: inexigibilidade de ressarcimento ao erário

 

Embora não haja nesta ação, pedido de declaração da existência ou configuração de ato de improbidade administrativo dos requeridos, mesmo se houvesse, não haveria condições de ser recebida. Aliás são os atos de improbidades que ensejam o ressarcimento.

Para a configuração da chamada improbidade administrativa, é necessário que a imputação de tal ato se faça acompanhar das provas que demonstram ter agido o agente público, com vontade livre e consciente de buscar o resultado sabidamente ilícito, ou seja, é necessário que a acusação venha acompanhada da prova de existência de dolo na ação ou omissão do agente, capaz de engendrar o dever de indenizar.

Em primeiro lugar, denota-se a ausência, pelo menos até o momento, de um processo administrativo válido, quer da autora, quer do Ministério Público, instaurado através de uma Portaria, com intimações, publicações, direito de defesa, etc, que apurasse a responsabilidade do requerido que ora contesta a ação.

Isso denota a ausência da apuração, na forma que a legislação prescreve, dos fatos em sede administrativa, através de uma sindicância interna, o que já se verifica não ser cabal a afirmação contida na inicial.

Em uma sindicância, a autora, além de documentos, poderia obter depoimento de funcionários e dispor de outros meios de prova, como ouvir os envolvidos no caso, para que ficasse clara, de quem seria a responsabilidade pela suposta lesão alegada na inicial.

Isso sem contar que a autora detém toda a documentação em sua posse, mas preferiu se manter silente a respeito e omissa na apuração real e efetiva dos fatos. Preferiu não ser eficiente.

Outro ponto inquestionável é que também não há prova de má-fé do requerido que ora contesta a ação no contexto apresentado e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça exige a comprovação cabal do dolo para que seja possível o pedido de ressarcimento, o que podemos ver no exemplo abaixo:

 “ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPUTAÇÃO DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (ART. 11, V DA LEI 8.429/92). ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADES NO CONCURSO PÚBLICO MUNICIPAL. REJEIÇÃO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 17, § 8o. DA LEI DE IMPROBIDADE. EXTINÇÃO DO PROCESSO PELO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. ANULAÇÃO DO DECISUM PRIMEVO NO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE ATO DE IMPROBIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARA RESTABELECER A SENTENÇA MONOCRÁTICA. 1. O recebimento da peça inicial da Ação de Improbidade Administrativa requer, além da constatação dos requisitos constantes no art. 282 3 Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa e coisa julgada. São Paulo, Atlas, 2010, p. 150. Alameda Santos, 2441, 10º andar São Paulo, SP CEP 01419-101 – Tel./fax: (11) 2679-3500 Setor Hoteleiro Sul, Quadra 06, Conjunto A, Bl. E, Edifício Brasil XXI, Salas 1020 e1021, Brasília, DF CEP 70316-902 – Tel./fax: (61) 3323-2250 13 do CPC, a comprovação da justa causa para a sua propositura, consubstanciada na averiguação de elementos concretos que atestem haver indícios suficientes acerca da materialidade da conduta desonesta (materialidade) e da responsabilidade do agente público (autoria). 2. Segundo a orientação dominante, a inicial da Ação de Improbidade Administrativa pode ser rejeitada (art. 17, § 8o. da Lei 8.492/92), sempre que, do cotejo da documentação apresentada, não emergirem indícios suficientes da autoria ou da existência do ato ímprobo. Esse tipo de ação, por integrar iniciativa de natureza sancionatória, tem o seu procedimento referenciado pelo rol de exigências que são próprias do Processo Penal contemporâneo, aplicável em todas as ações de Direito Sancionador. (...) 6. Nas ações sancionatórias - essa é uma lição repassada pelos melhores doutrinadores - é indispensável que a postulação inicial demonstre a presença de elementos confiáveis e seguros quanto à materialidade do ilícito e a sua provável autoria, sem que não se revela a sua justa causa, esse quarto elemento próprio das ações sancionadoras, ao lado do interesse processual, da possibilidade jurídica e do interesse de agir (art. 17, § 6o. da Lei 8.429/92). 7. Recurso Especial provido a fim de restabelecer in totum a sentença monocrática. Com fulcro no art. 509 do CPC, atribui-se efeito expansivo subjetivo à presente decisão, em relação aos demais litisconsortes. (REsp 1259350/MS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 22/10/2013, DJe 29/08/2014) (grifos nossos).”

A doutrina também exige a apuração do dolo e a demonstração da ocorrência do dano, demonstração essa que é impossível verificar na petição inicial, bem como nos documentos juntados.

Pedro da Silva Dinamarco[4], afirma que: “Ato lesivo é todo aquele portador de dano efetivo e concreto ao patrimônio de alguém. É preciso examinar o ato tal como ocorrido, tratando em seguida de saber se dele decorreu dano. Para se ter um ato lesivo e, portanto, indenizável, é necessário que ele já tenha causado dano. Logo, há que se deixar de lado exercício de futurologia. Aliás, em toda a disciplina da nulidade dos atos jurídicos em geral (privados ou públicos), o prejuízo concreto é que justifica a anulação (pás de nulité sans grieg). Daí o motivo para só caber a invalidação do ato ou o pedido de ressarcimento quando algum efetivo prejuízo existir. Se o ato se realizou e não causou prejuízo algum, ou se prejuízo algum foi provado (o que traz o mesmo resultado prático, pois quod non este in actis non est in mundo), a proclamação de eventual nulidade ou a procedência do pleito ressarcitório não tem lugar.”

Evidencia-se, sobremaneira, que não se pode generalizar, sem certos cuidados, toda conduta aparentemente irregular, como danosa, sob pena de dar-se uma exegese por demais extensiva, e por vezes injusta, exigindo não só a apuração dos fatos conforme a lei determina, mas a análise subjetiva dos fatos, o que não ocorreu por parte da autora, tampouco do ilustre membro Parquet.

A Ação proposta pela autora, bem como a denunciação da lide são integralmente frágeis em relação ao acusado e, principalmente a denunciação da lide, que não contém fundamentos. Se trata da consideração de um fato (exercício do mandato), que sustenta uma alegação muito mais complexa, que deveria ter vindo amparada com mais elementos de prova que os apresentados.

É, portanto, inegável que não basta à subsistência em tese, de qualquer violação principiológica, para que o ato administrativo considerado ilegal e lesivo tenha seu valor financeiro cobrado, é preciso que o ato seja praticado dolosamente, contrário aos princípios da honestidade, lealdade, boa-fé etc., e gere perigo real de dano ao patrimônio público, aferindo-se, junto ao potencial ofensivo da conduta, o princípio da proporcionalidade na aplicação das sanções devidas.

A brilhante decisão abaixo demonstra exatamente o que se está defendendo e invocando nesta contestação, vejamos:

“A boa fé, a inocência, a probidade, se presumem. A má-fé, o dolo, a desonestidade, a imoralidade, o enriquecimento ilícito, estes sim, exigem prova cabal e inquestionável quanto a sua configuração. E, não estando demonstrado nos autos o comportamento, ilegal, imoral e ilícito da acionada, descabe qualquer aplicação de penalidade por improbidade administrativa.” (Informativo de Licitações e Contratos, ano VII, nº. 88, junho de 2001, p. 454). (grifo nosso)

 

Aliás, nessa esteira, a jurisprudência abaixo entoou:

 

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADEADMINISTRATIVA.LEI N. 8.429/92. INCONSTITUCIONALIDADE. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRELIMINARES DO RECORRIDO. INTEMPESTIVIDADE E DESERÇÃO. REJEIÇÃO PRELIMINARES DA RECORRENTE INÉPCIA DA INICIAL, CARÊNCIA DE AÇÃO E CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO ACOLHIMENTO. ATOS ÍMPROBOS POR VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. AUSÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO DOLO GENÉRICO - PRECEDENTES DO STJ - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PROVIDO. (...) A individualização de cada uma das condutas não é necessária na Ação Civil Pública, sendo suficiente a descrição genérica dos fatos e das imputações. Não há falar em cerceamento de defesa quando caracterizado nos autos que à defendente foi oportunizado manifestar-se sobre as irregularidades desde a constatação pelos técnicos do Tribunal de Contas, onde também ofereceu impugnação, inclusive regularizando algumas delas. Conforme inúmeros precedentes do Superior Tribunal de Justiça, a ofensa aos princípios da Administração Pública, ilícito previsto no artigo 11 da Lei n. 8.249/92, exige demonstração do elemento subjetivo - dolo genérico. (TJMT, Apelação n.º 18134, Relator: Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, 3ª Câmara Cível, Data Julgamento: 21.09.2010).”

“RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADEADMINISTRATIVA - VEREADOR E OUTROS - OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE E IMPESSOALIDADE AFETOS À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO AO MUNICÍPIO - AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ - NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ATO DE IMPROBIDADE - AUSÊNCIA DE PROVA - SENTENÇA RETIFICADA - ABSOLVIÇÃO - RECURSO PROVIDO. Para a caracterização do ato de improbidade administrativa se faz necessário a caracterização de lesão ao Município ou enriquecimento ilícito do agente, não sendo suficiente o agir em desconformidade com a lei. Dessa forma, o ato praticado pelo então prefeito, que dispensou a realização de licitação, não autoriza a procedência do pedido inicial de ação civil pública, pois na hipótese não houve o prejuízo concreto ao Município, nem a caracterização da ma-fé. O Superior Tribunal de Justiça tem decidido, de forma reiterada, que somente se caracteriza o ilícito previsto na lei de improbidade administrativa se ficar comprovado - de forma cabal e induvidosa - que o agente se enriqueceu ilegalmente e que ele tenha provocado dano material concreto ao ente público (TJMT, Apelação nº 51905/2009, Terceira Câmara Cível, Relator: Des. Evandro Stàbile, Data Julgamento: 05.10.2009).”

Denota-se da leitura dos entendimentos sufragados, que a jurisprudência é clara ao exigir como elemento do tipo improbidade administrativa a intenção de praticar uma ilegalidade. Onde o elemento subjetivo é, portanto, requisito inafastável para tipificação da conduta punível. Em outras palavras, a vontade específica de violar a lei é requisito fundamental da imposição das pesadas sanções previstas na lei ora comentada.

Com efeito, demonstrado de forma cabal que não houve qualquer ato de improbidade administrativa por qualquer tipo de ilícito, de rigor que também que não emirja qualquer responsabilidade de ressarcir ou indenizar.

Por estes fatos é que se observa a demasiada superficialidade da imputação feita pelo denunciante, com apoio da autora e do Ministério Público, devendo, por isso, ser a presente ação julgada totalmente improcedente, em razão da absoluta não caracterização do ato de improbidade apontado, inexistindo, assim, direito de indenizar.

Assim como na hipótese do art. 11 da Lei nº 8.249/92, também tem-se exigido o dolo para a configuração do enriquecimento ilícito, pois todas as espécies de atuação suscetíveis de gerar enriquecimento ilícito pressupõem a consciência da antijuridicidade do resultado pretendido.

Não é uma simples afirmação, que pode sustentar uma ação judicial desse porte contra o requerido que ora contesta a ação, motivo pelo qual a ação deve ser rejeitada, de plano, para que não surta mais efeitos nefastos ao requerido, dos que os já causados, pois se não configurado ou provado um ato de improbidade, não pode ser cobrado qualquer dano.

 

2.3.4. Da necessidade de demonstração de efetiva lesão ao patrimônio público

 

A ocorrência de lesão ao erário não foi comprovada ou investigada pela autora em relação ao requerido que ora contesta a ação, o que seria necessário para que a ação também o incluísse no polo passivo.

Vejamos a definição de “lesão ao erário” trazida pela lei de improbidade administrativa:

 

“Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (...)”

 

Depreende-se das alegações lançadas na petição inicial, que a autora nem sabe ao certo o que aconteceu, contudo sabe acusar como se soubesse, pois considera o requerido que ora contesta a ação, como responsável pelo ressarcimento pelos supostos danos causados à municipalidade, sem que praticasse qualquer ato administrativo que pudesse ser considerado ilegal ou de má-fé.

Nem dolo e nem culpa também podem ser atribuídos ao requerido que ora contesta a ação, que recaiu em erro invencível, pois agiu iludido pela presunção de legalidade natural do procedimento licitatório.

A ocorrência ou não de lesão ao erário, somente seria possível afirmar, caso a autora tivesse concluído de maneira cabal e legal, através de processo administrativo regular, que pode-se dizer que o requerido que ora contesta a ação causou lesão financeira.

É esse o motivo que faz com que a presente ação não seja sequer conhecida, pois não há nada apurado e, por isso, a autora jamais poderia lançar essa afirmação de maneira tão irresponsável, sem antes ter feito sua obrigação administrativa de proceder a uma ampla sindicância antes de qualquer atitude judicial.

O Ministério Público e o Tribunal de Contas são entidades remotas, mas a autora detém os dados, os documentos, os técnicos e a capacidade administrativa para a apuração do dano.

Se a autora tivesse se preocupado em uma investigação interna corporis, veria que o requerido que ora contesta a ação jamais poderia ter sido admitido em seu polo passivo.

Tratando do tema, o Julgado da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça trazido abaixo, é um exemplo interessante da exigência não só da prova do dolo, mas do prejuízo, o que inexiste nos autos:

 

“PENAL. ARTIGO 89 DA LEI N.º 8.666/93. DISPENSA DE LICITAÇÃO. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO E DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. NECESSIDADE. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA CORTE ESPECIAL. RESSALVA DA RELATORA. DESCRIÇÃO INSUFICIENTE NA DENÚNCIA. NÃO ATENDIMENTO DO ART. 41 DO CPP. INÉPCIA. TRANCAMENTO. FALTA DE JUSTA CAUSA. MATÉRIA DE PROVA. 1. Nos autos da Ação Penal n.º 480/MG, a Corte Especial deste Sodalício acolheu, por maioria, a tese de ser imprescindível a presença do dolo específico de causar dano ao erário e a demonstração do efetivo prejuízo para a tipificação do crime previsto no artigo 89 da Lei n. 8.666/1993. Ressalva do entendimento da relatora. 2. Na hipótese em apreço, a denúncia, sem atender às disposições do art. 41 do Código de Processo Penal, não descreve o dolo específico e nem o efetivo prejuízo, limitando-se à burla da licitação, sendo, pois, inepta. 3. De outra parte, o pretendido trancamento, por falta de justa causa, que depende da certeza da inexistência do elemento subjetivo e da total ausência de prejuízo, não está demonstrado sem maiores digressões, necessitando de revolvimento fático-probatório, não condizente a via eleita, mandamental por excelência. 4. Recurso parcialmente provido, apenas para anular a denúncia por inépcia, ressalvando a possibilidade de uma nova ser apresentada, desde que, dentro dos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, seja demonstrado o dolo e específico e o efetivo prejuízo aos cofres públicos. (STJ - RHC: 36562 SP 2013/0079415-9, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 11/11/2014, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/11/2014)”

 

Resta evidente que singelos argumentos, acompanhados de uma mera afirmação, sem qualquer comprovação do dolo, do enriquecimento e da lesão ao erário e do ato ímprobo, não podem, jamais sustentar uma ação judicial com consequências tão graves e humilhantes, sem que uma apuração séria, e dentro da lei, tivesse sido feita, o que motiva a total improcedência da ação.

Como estamos diante de um pedido da aplicação de normas que impõem a aplicação de uma sanção, aflora a natureza penal do instituto, que deve ser tratado com tal e exigir uma investigação prévia em relação ao requerido que ora contesta a ação, como no caso do inquérito policial, do inquérito civil do Ministério Público e, no caso da autora, uma sindicância finalizada e legalmente válida, seria imprescindivelmente necessário.

 

2.3.5. Da desproporcionalidade e falta de razoabilidade

 

Sem provas, sem apuração e até sem mesmo uma descrição da conduta que o requerido que ora contesta a ação pudesse ser responsabilizado nesta ação, a situação se torna desproporcional, bem como lhe falta a razoabilidade.

Por primeiro não temos a descrição de qual conduta do requerido que ora contesta a ação teria ferido a lei!

Em segundo lugar não existe qualquer prova que o requerido que ora contesta a ação tenha agido com má-fé, dolo ou mesmo sabendo que existia uma ilegalidade.

Em terceiro, não existe qualquer prova, fato ou nexo de causalidade que possa fazer atribuir qualquer tipo de responsabilidade ao requerido que ora contesta a ação.

No que tange ao valor cobrado, pelo período que o requerido em questão exerceu mandato eletivo, não poderia, jamais, ser denunciado para pagamento do valor integral, já que não possui qualquer responsabilidade sobre os períodos em que exerceram mandato eletivo, os Srs. [litisconsorte passivo 1] e [litisconsorte passivo 2].

Neste caso é evidente a afronta ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade contidos implicitamente na Constituição Federal, situação que merece a devida intervenção do Poder Judiciário para fazer prevalecer o justo.

 

3. Da necessidade da concessão da justiça gratuita para o requerido que ora contesta a ação

 

O requerido que ora contesta a ação não possui condições de arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, em vista de sua atual condição de saúde e financeira.

Em função de um infarto e da condição de aposentado (Docs.j.), o requerido não possui boas condições de saúde e sua renda, limitada, está altamente comprometida com sua recuperação.

Os documentos anexados, que representam suas condições financeiras (Comprovante de recebimento de benefício e extratos bancários) e sua condição e saúde (documentos médicos), motivo que leva a concluir de maneira inexorável que o requerido que ora contesta a ação faz jus à gratuidade requerida.

Assim, nos termos dos artigos 98 e seguintes do Código de processo civil e nos ditames da Lei nº 1.060/50, bem como na Declaração ora anexada, requer-se o deferimento da isenção do pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, por medida de justiça e humanidade.

 

3. Considerações finais

 

Com a defesa agora exposta, vemos que a participação do requerido que ora contesta a ação no polo passivo desta ação decorre de interpretações sem embasamento lógico, sem embasamento legal e sem a devida análise, sendo uma aventura jurídica do requerido [nome do litisconsorte passivo], para tumultuar o processo, haja vista que o mesmo sabe que o requerido que ora contesta a ação não possui qualquer responsabilidade.

A falta de uma versão que pudesse apontar um fato antijurídico praticado, ao menos, ao requerido que contesta a ação por via desta peça, demonstra a inexistência de qualquer responsabilidade em seu desfavor.

E as provas? É uma situação absurda basear um pedido de denunciação da lide sem qualquer prova a respeito.

Acaba por se tornar leviana a denunciação da lide e temerária sua aceitação pela autora e pelo Ministério Público, que é rigoroso ao apontar o erro alheio, mas nesse caso é um erro seu que deve ser avaliado, pois não apresenta qualquer fundamento para sua aceitação, o que é juridicamente exigível.

O requerido que ora contesta a ação, da mesma forma que está sendo cobrado, cobrará os prejuízos materiais e morais que está sofrendo, dos responsáveis e co-responsáveis pelas ilegalidades das quais está sendo vítima e, inclusive adotará as medidas administrativas que também se mostrarem pertinentes para que haja mais reponsabilidade no trato de um procedimento e de assuntos tão importantes e sérios, pois condutas desidiosas não podem ser toleradas no ambiente judicial.

Desta forma, a improcedência da ação em relação ao requerido que ora contesta a ação, seja por problemas técnicos, seja pelas alegações de mérito, é obrigatória, sob pena de um grave, lamentável e odioso erro.

 

4. Dos pedidos

 

Ante ao exposto, requer-se:

a) o acolhimento da tese preliminar de inépcia da petição inicial e da denunciação da lide em desfavor do requerido [nome], em vista que ambas as peças processuais não trazem os fatos e os fundamentos jurídicos necessários para a ação, condenando-se a autora, o denunciante e o Estado, solidariamente, no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, na forma de lei;

b) o acolhimento da tese preliminar de ilegitimidade de parte, para excluir o requerido [nome] do polo passivo da ação, extinguindo-a sem julgamento de mérito em relação a ele e, condenando a autora, o denunciante e o Ministério Público (Estado), ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, em vista da forma que atuaram no processo;

c) o acolhimento da tese preliminar de incorreção do valor da causa, determinando-se que a autora corrija o valor da causa para o importe de R$ 25.465.913,72 (vinte e cinco milhões, quatrocentos e sessenta e cinco mil, novecentos e trezes reais e setenta e dois centavos), recolhendo-se as custas proporcionais e faltantes, para que o processo possa ter seu regular prosseguimento, sob pena da extinção da ação;

Caso as teses preliminares não sejam consideradas:

d) que a ação seja julgada totalmente improcedente, em vista da falta de fatos, provas e de qualquer coisa que pudesse embasar essa ação em desfavor do requerido [nome], para absolvê-lo de qualquer condenação de ressarcimento, pois não praticou qualquer conduta que pudesse ser considerada ilegal, dolosa, abusiva ou de má-fé;

Demais pedidos:

e) Que a autora, o denunciante e o Estado (que representa o Ministério Público), sejam condenados ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, na forma da legislação processual vigente;

f) A concessão da justiça gratuita, na forma da Lei nº 1.060/50 e 98 e seguintes do Código de processo civil, conforme a documentação ora anexada;

g) A concessão de 15 (quinze) dias para a juntada do respectivo instrumento de mandato, que não foi possível ainda juntar aos autos nesta ocasião, com fulcro no artigo 104 do Código de processo civil;

h) o direito de provar suas alegações por qualquer meio de prova permitido em lei, principalmente as que se fizerem necessárias ao exercício da ampla defesa, sem qualquer tipo de exceção.

Nestes termos,

P. deferimento.

São Paulo, 07 de março de 2.022.

 

ÉRICO T. B. OLIVIERI

OAB/SP 184.337

ADVOGADO

 

 



[1] Inquérito Civil MP de [nome do município] nº 00.0000.0000000/0000-0

[2]  CPC – “Art. 485.  O juiz não resolverá o mérito quando: I - indeferir a petição inicial; [...] IV - verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo;”

[3]

[4] DINAMARCO, Pedro da Silva. Ação Civil Pública. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 291.

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