domingo, 3 de abril de 2022

[Modelo] Petição inicial de ação de obrigação de fazer c.c. pedidos de indenização por danos morais e de tutela de urgência

 Ao Juízo de Direito da ___ Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo - Capital.

 

[Nome e qualificação do autor], vem, por seu advogado in fine identificado (Instrumento de mandato em anexo), respeitosamente à presença de Vossa Excelência para propor, com fulcro nos artigos de lei, doutrina e jurisprudência ora apresentados e todas as normas aplicáveis à hipótese, propor

 

Ação de obrigação de fazer c.c. pedidos de indenização por danos morais e de tutela de urgência

 

Em desfavor de [Nome e qualificação do réu], ante os elementos de fato e argumentos de direito abaixo expendidos:

 

1. Dos fatos

 

 

O réu e sua esposa, aos 00/00/0000, celebraram instrumento particular de promessa de compra e venda de um imóvel residencial, no valor de R$ 250.000,00 (Duzentos e cinquenta mil reais), com a pessoa da Sra. [Nome], conforme consta da cópia do referido contrato, ora anexado.

 

Em vista que o autor apresentou os compradores (réu e esposa) aos vendedores (Sra. “nome”), lhe foi prometido pelos compradores, o pagamento de uma quantia pela aproximação das partes contratantes, no importe de 6% (seis por cento), ou seja, o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), que foi devidamente pago, logo após a celebração do contrato.

 

Ocorre Excelência, que após pago o sinal previsto no contrato de R$ 10.000,00 (dez mil reais), o réu e sua esposa se arrependeram da compra feita, tendo em vista exigências feitas pelo Banco que iria financiar o restante do valor da compra (R$ 240.000,00) e que não foram satisfeitas por eles.

 

Por conta disso, o réu procurou a vendedora e requereu a rescisão do contrato, com a devolução parcial do valor que já havia sido pago a título de sinal e princípio de pagamento e, também passou a assediar o autor para a devolução do dinheiro pago pela aproximação das partes do referido contrato.

 

A partir de então, o réu passou, de forma unilateral, a considerar em seu íntimo, que poderia cobrar todo o dinheiro pago ao autor, de volta, o que foi contestado, em vista que o negócio jurídico realizado entre o réu e a vendedora havia se aperfeiçoado juridicamente, com a assinatura do contrato, tanto que até o pagamento do sinal foi realizado.

 

Ao passar do tempo, as intervenções do réu junto ao autor para o recebimento da quantia “que lhe era devida”, passaram a ser mais incisivas e ameaçadoras, razão pela qual, e sentindo que o réu sinalizava que poderia lhe causar problemas maiores, o autor pagou alguns valores a título de devolução parcial, mesmo discordando das razões jurídicas do réu.

 

Mas isso não foi o suficiente, o réu passou a cobrar o dinheiro todo de uma única vez, em tom ameaçador e de forma insistente, motivo que levou o autor a pedir para que ele procurasse a justiça, pois realmente entendia que estava sendo injustiçado com as cobranças e se sentindo coagido/ameaçado.

 

Por tal posicionamento do autor, o réu começou a lhe ameaçar e ofendender sua honra e decoro, por escrito, por via do aplicativo de mensagens eletrônicas whatsapp, conforme vemos, por amostragem, nos textos abaixo reproduzidos das conversas entre autor e réu, a seguir reproduzidos:

 




Apenas esses três exemplos demonstram a amplitude e a gravidade das intervenções ameaçadoras do réu, conforme os arquivos ora juntados e demonstrados, que somam diversas condutas criminosas.

Não contente em se valer de meios ameaçadores e humilhantes, o réu, em 00/00/0000, em uma atitude multicriminosa[1][2][3][4], pichou em um muro bem em frente ao condomínio onde reside o autor, os seguintes dizeres:

 

“ – nome omitido - ladrão, não comprem imóvel com um ladrão não tem cresci – nome omitido - ladrão vagabundo”” (SIC)

 

A ilustração fotográfica a seguir dá uma noção da visão dos dizeres escritos pelo réu, da portaria do Condomínio onde reside o autor, demonstrando o grau de exposição de seu nome, vejamos:

 

[Foto da pichação]

 

A exposição negativa e criminosa do nome do autor em frente ao local onde reside, foi tamanha, que causou vergonha alheia e um de seus vizinhos tentou, por conta própria, apagar as palavras mentirosas, ofensivas à honra e à fama do autor, contudo, ao que parece, não foi bem sucedido, pois ainda é possível ler todas as palavras escritas, em especial a palavra “vagabundo”, vejamos:

 

[Foto da pichação com riscos parciais de spray preto, com a palavra “vagabundo” sem riscos]

 

O vídeo demonstrado através do CD (Compact disc) que será apresentado oportunamente, conforme pedido feito ao final, que demonstra bem melhor a situação atual da pichação feita pelo ré, tendo em vista que pela largura da rua não é possível enquadrar em uma só fotografia, todo o texto.

 

Não bastasse tal situação, a pichação repercutiu no grupo virtual de moradores do Condomínio perante a rede social Facebook, onde reside o autor, e foi até motivo de postagem com fotos e com diversos comentários, o que demonstra melhor a imagem a seguir:

 

[Imagem de comentário no Grupo do Condomínio onde reside o autor com imagem do réu pichando o muro]

 

 

Veja Excelência, que a atitude do réu permitiu que outras pessoas, de forma igualmente ilícita, propagassem a injúria e a difamação em uma rede social que expôs por uma segunda vez o autor, para um Condomínio edilício inteiro, composto por 5 (cinco) torres de 7 (sete) andares, com mais de 300 (trezentos) apartamentos e um número superior a mil moradores.

 

Com efeito, a publicação dos fatos vivenciados pelo autor teve 14 comentários e até a atuação de um perfil fake, denegrindo ainda mais sua imagem. Desconfia-se que se trata do próprio réu, mas o autor prefere aguardar as investigações da Polícia, pois já registrou boletim de ocorrência sobre os atos do réu.

O grupo social do Condomínio onde reside o autor, no Facebook, possui 452 (quatrocentos e cinquenta e dois) membros, o que demonstra o grau de exposição que sofreu, sobre os fatos ora narrados.

 

Por tais razões, o autor busca a tutela jurisdicional para que seus direitos civis sejam resguardados e restabelecidos, em razão que o caso se trata de ofensa grave e permanente aos seus direitos personalíssimos, conforme veremos na exposição de fundamentos jurídico-legais, a seguir.

 

 

2. Do direito

 

 

2.1. Da obrigação de reparação dos danos causados pela prática de ato ilícito

 

 

O réu, utilizou-se da pichação, como um dos meios para exteriorizar uma duvidosa indignação, imprimindo em bem público, com tinta spray, palavras injuriantes e difamantes em relação ao autor, crimes que, na esfera civil são considerados inexoravelmente como atos ilícitos.

 

Por ato ilícito, entende-se toda conduta danosa praticada em descordo com o ordenamento jurídico e, em um silogismo básico, temos que a conduta do réu desdobrou-se em atos ilícitos em sua essência, pois se praticou crimes e violou a dignidade do autor, causando-lhe danos, praticou ato ilícito.

 

Renomados a doutrina não destoa dessa linha de raciocínio, conforme vemos no exemplo a seguir:

 

“[...] os atos ilícitos são os que promanam direta ou indiretamente da vontade e ocasionam efeitos jurídicos, mas contrários ao ordenamento. O ato voluntário é, portanto, o primeiro pressuposto da responsabilidade civil [...].

 

O ato de vontade, contudo, no campo da responsabilidade deve reverter-se de ilicitude. Melhor diremos que na ilicitude há, geralmente, uma cadeia ou sucessão de atos ilícitos, uma conduta culposa. Raramente a ilicitude ocorrerá com um único ato. O ato ilícito traduz-se em um comportamento voluntário que transgride um dever. Como já analisamos, ontologicamente o ilícito civil não difere do ilícito penal; a principal diferença reside na tipificação estrita deste último.”[5]

 

Etimologicamente, a palavra "ilícito" se originou a partir do latim illicitus​, se referindo ao que é ilegal, proibido ou moralmente errado.

 

Como corolário desse posicionamento jurídico, temos o artigo 186 do Código civil, que traz a definição ex lege de ato ilícito, vejamos:

 

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

 

De forma automática e irresistível, a prática de um ato ilícito danoso remete ao dever de reparação, cuja previsão legal consta do artigo 927 do Código civil, a saber:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”

 

Da interpretação dessa norma vemos que o dano causado por ato ilícito indenizável é presumido, ainda mais quando o ilícito foi praticado de forma intencional, dolosa e criminosa.

 

As atitudes do réu se configuram, à luz do direito apresentado, perfeita e indiscutivelmente como diversos atos ilícitos indenizáveis praticados em desfavor do autor.

 

Merece destaque o fato que a pichação tem efeito permanente, enquanto puder ser identificado o seu conteúdo, pois a prova ora apresentada demonstra que é possível, inclusive identificar o nome do autor, mesmo após a tentativa de um morador do condomínio de riscar a pichação com tinta spray preta.

 

Por tais razões, temos que a obrigação de reparação do dano não consiste apenas na compensação da ofensa moral, mas também na cessação da ofensa através da limpeza completa da pichação.

 

Conforme veremos nos tópicos a seguir, restarão demonstradas as vertentes da reparação devida pelo réu.

 

 

2.2. Do dever de cessação da ofensa moral: obrigação de fazer

 

 

O artigo 927 do Código civil é literal em prever a reparação do dano causado. Relembremos o teor da norma:

 

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” (grifo nosso)

 

No caso dos autos, a reparação moral não se dá apagando os fatos vividos da memória do autor, mas compensando-o financeiramente pela vivência, na medida dos parâmetros legais; de outro lado, a reparação também consiste na cessação da ofensa contida na pichação (que ainda é facilmente perceptível), que deve se dar imediatamente, com a determinação da limpeza física completa de seus dizeres.

 

A reparação, nesse caso é de rigor e se faz urgente, como será explicitado em tópico próprio (tutela de urgência), pois é inaceitável que uma ofensa de tal magnitude permaneça surtindo efeitos.

 

A pichação identificando o prenome e o patronímico do autor, viola frontalmente o direito fundamental de sua honra e imagem, o que fere o inciso X, do artigo 5º da Constituição Federal, cujo texto que segue abaixo:

 

“Constituição Federal - Art. 5º. [...] X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;”

 

Combinando os direitos contidos no inciso X, do Artigo 5º da Constituição Federal, com os ditames do artigo 927, in fine do Código civil, por serem aplicáveis em conjunto e simultaneamente ao caso, impõem ao réu, o dever de reparar o dano, para fazer cessar a ofensa moral, no sentido de apagar a pichação que realizou, conforme já informado.

 

A jurisprudência já enfrentou o tema e considerou palavras como “Ladrão” e “vagabundo”, como ofensivas, se proferidas em ambiente público, vejamos:

 

“Indenização por danos morais Alegação do autor de que a ré lhe teria ofendido a honra- Expressões proferidas ("vagabundo, porco, ladrão") na presença de várias pessoas (clientes e funcionários do autor) Dano moral configurado Indenização devida - Decisão incensurável - Sentença mantida Art. 252, RITJ - Recurso não provido.  (TJ-SP - APL: 01298532120078260001 SP 0129853-21.2007.8.26.0001, Relator: Miguel Brandi, Data de Julgamento: 27/11/2013, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/11/2013)” (grifo nosso)

 

Diante dessas colocações, vemos que não existe direito que socorra o réu, no sentido de não ter a obrigação de apagar a pichação, pois as ofensas que proferiu são atos ilícitos, inquestionavelmente, e cada dia que passa a lesão moral só aumenta, sendo uma situação que deve ser considerada para que, ao final prevaleça o dever de reparação, no sentido de condená-lo à limpeza da pichação, como ao final se requer, não só para que cesse a agressão, mas para que lhe sirva de uma lição de cidadania, que realmente se faz necessário neste caso.

 

Requer-se que sejam aplicados todos os meios necessários a fim de fazer com que a decisão que determinar a limpeza da pichação pelo réu seja realmente cumprida, cumulando multa diária e a aplicação de crime de descumprimento de ordem judicial, caso o comando judicial não seja cumprido.

 

 

2.3. Do dano moral

 

 

Por qualquer ângulo que se analise os fatos descritos nesta petição inicial, estão presentes os requisitos autorizadores da condenação do réu ao pagamento de uma indenização por dano moral.

 

O ressarcimento do autor decorre das seguintes características jurídicas dos atos do réu:

 

a)     Atos criminosos (pichação, injúria, difamação e ameaça);

b)     Atos intencionais (doloso);

c)      Ato que expõe ofensivamente o nome do autor;

d)     Atos danosos que geram abalo psíquico;

e)     Atos que são perfeitamente puníveis.

 

Primeiramente temos que as ameaças constantes proferidas pelo réu, a pichação e depois o surgimento de publicação em grupo interno do Condomínio edilício onde reside o autor, formam um enredo de uma situação que deve ser tratada de forma exemplar pelo Poder Judiciário.

 

Expor uma pessoa a uma situação dessa demonstra que o réu não confiava no próprio direito haver algum valor do autor, como também não estava interessado em resolver a questão, mas apenas em violar direitos e pressionar emocionalmente. (Artifício de quem não possui razão)

 

Vemos que o réu poderia ter se valido do Poder Judiciário para cobrar eventual e suposto direito que entendia ter, mas preferiu um modus operandi criminoso, ofensivo.

 

A maior demonstração das intenções desleais do réu é que preferiu utilizar-se de um sofisma com o argumentum ad hominem (latim, argumento contra a pessoa) ofensivo, pois visa apenas atacar a pessoa do autor, sem fundamentar seu suposto e duvidoso direito.

 

Com sua conduta repugnante, o réu violou o direito fundamental da honra e da imagem do autor, que ainda sofre o abalo de seu estado de espírito, pois foi ameaçado também.

 

A Jurisprudência já apreciou caso semelhante reconheceu a ocorrência do dano moral, vejamos:

 

“APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL - OFENSAS VERBAIS - INJÚRIA E CALÚNIA - DANOS MORAIS - OCORRÊNCIA - ABALO À HONRA SUBJETIVA - INDENIZAÇÃO DEVIDA. RECURSO PROVIDO. 1 - Comprovado nos autos que a requerida agrediu verbalmente o autor, chamando-o de "viado", "vagabundo", "ladrão", e dizendo "que sua mãe é puta de zona", resulta patenteado o abalo à honra subjetiva, ensejador do dever de indenizar. 2 - A fixação do montante indenizatório a título de dano extrapatrimonial fica ao prudente arbítrio do Julgador, devendo pesar nestas circunstâncias, a gravidade e duração da lesão, a possibilidade de quem deve reparar o dano, e as condições do ofendido, cumprindo levar em conta que a reparação não deve gerar o enriquecimento ilícito, constituindo, ainda, sanção apta a coibir atos da mesma espécie. (TJ-PR - AC: 7672586 PR 0767258-6, Relator: Luiz Lopes, Data de Julgamento: 16/06/2011, 10ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 668)” (grifo nosso)

 

Nos termos dos artigos 186 e 927, ambos do Código civil, o réu deve ser condenado, de forma exemplar, a pagar uma indenização para o autor, pois violou direito, causou dano, enfim, praticou diversos atos ilícitos e não pode sair impune.

 

 

2.3.1. Da presunção do dever de reparação moral

 

 

Como já esclarecido, as atitudes do réu configuraram atos ilícitos danosos ao autor, o que presume o dever de reparação.

 

Vimos na descrição dos fatos desta petição inicial, que o autor foi ameaçado, injuriado, difamado e humilhado para todo o seu círculo social, já que é pessoa muito conhecida no Condomínio Edilício em que reside.

 

Vemos na atitude do autor não só o ato ilícito, como extrai-se a interpretação de um comportamento premeditado, doloso, criminoso e ofensivo, que jamais poderia ser considerado válido no mundo jurídico.

 

Ser chamado de filho da puta, ladrão, arrombado em ambiente particular e público torna inquestionável e presumido o dever de reparar.

 

Como esperado, a jurisprudência considerou dizeres semelhantes aos ditos pelo réu, como dano moral, vejamos:

 

“Responsabilidade civil. Indenização por danos morais. Procedência. Ofensas verbais injustificadas. Condenação na esfera criminal por injúria e difamação. Ato ilícito e obrigação de indenizar configurados. Danos morais presumidos. Verba indenizatória mantida. Recurso a que se nega provimento. (TJ-SP - APL: 00102696820068260526 SP 0010269-68.2006.8.26.0526, Relator: Mauro Conti Machado, Data de Julgamento: 06/08/2014, 4ª Câmara Extraordinária de Direito Privado, Data de Publicação: 21/08/2014)” (grifo de destaque)

 

 

Na verdade as palavras ofensivas dirigidas ao autor via aplicativo de mensagens (whatsapp) e as contidas na pichação em ambiente público, caracterizam o dano in re ipsa (que decorre do próprio fato), pois em primeira análise se trata de uma conduta criminosa, de inquestionável repercussão na esfera psíquica do autor, que de per si dispensa a existência de provas do dano.

 

Filosoficamente, Sérgio Cavalieri Filho fundamenta o dano moral in re ipsa:

 

“(...) por se tratar de algo imaterial ou ideal a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão de fatores instrumentais. Neste ponto, a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras de experiência comum.” (Programa de Responsabilidade Civil, 5ª ed., Malheiros, 2004, p. 100/101). (grifo nosso)

 

O julgado abaixo, utilizado de forma analógica, instrumentaliza e expõe a teoria:

 

“RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. OFENSAS VERBAIS. DANO MORAL IN RE IPSA. - Caso em que o autor, quando procurava atendimento junto à instituição financeira ré para renegociação de dívida, foi chamado de caloteiro por funcionário do banco. Demonstração dos fatos constitutivos ao direito do requerente. Dano moral in re ipsa. Ofensa à honra e imagem da parte. Lição doutrinária e jurisprudencial. - Ausente sistema tarifado, a fixação do montante indenizatório ao dano imaterial está adstrita ao prudente arbítrio do juiz. Valor fixado em sentença mantido. - Honorários advocatícios. Balizadoras do CPC. Manutenção. NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70073685943, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 29/06/2017) (TJ-RS - AC: 70073685943 RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Data de Julgamento: 29/06/2017, Décima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 06/07/2017)” (grifo do subscritor)

 

Se não bastasse, apesar de desnecessário, resta perfeitamente delineada a relação conduta - nexo causal- dano, que faz a condenação do réu ao pagamento do dano moral, algo obrigatório, conforme os preceitos legais válidos e aplicáveis neste caso.

 

A exposição colocada neste tópico, demonstra que as ofensas proferidas pelo réu contra o autor são graves o suficiente para ensejar o reconhecimento automático da ocorrência de dano moral, o que se requer ao final, protestando-se pela total procedência do pedido.

 

 

2.3.2. Da valoração do dano moral

 

 

Superada a defesa da existência do dever de indenizar do réu, passemos aos critérios da valoração da indenização.

 

Primeiramente é necessário destacar a extensão do dano, primeiro critério da valoração[6].

 

Nesse particular, vimos que o autor teve sua honra ofendida diversas vezes, por via de aplicativo de mensagens (whatsapp), por via da pichação de ofensas com o seu nome expresso e pela via da difusão das informações a todo o seu meio social, com a ocorrência de publicação de fotos e diversos comentários sobre o fato no grupo de moradores do condomínio onde reside, na rede social Facebook.

 

De mais a mais, tais ofensas foram geradas por uma atitude consciente e exclusiva do réu, que dura até os dias atuais.

 

A extensão do dano, então, em termos de veiculação do ato criminoso da pichação perante um grande número de pessoas é profunda, capaz de abalar emocionalmente qualquer pessoa, o que se afirma com segurança, pois basta um singelo exercício de colocar-se no lugar do autor, para imaginar as consequências dos atos praticados pelo réu.

 

Em relação à já consagrada tríplice função do dano moral, defende-se que deve ser fielmente seguida, a fim da indenização surtir seus efeitos pedagógico, punitivo e compensatório.

 

Protesta-se aqui, pelo arbitramento de um valor que seja realmente sentido pelo réu, pois seus atos são repugnantes, reprováveis e não podem se repetir. Não podemos homenagear o crime, de qualquer forma, razão pela qual o valor da indenização deve ser à altura das ofensas proferidas, da forma de sua divulgação e de seu alcance no meio social do autor.

 

Não se pede aqui para que o réu seja condenado a ficar pobre, mas que seja condenado a pagar um valor que compense o dissabor vivido, puna e ensine ao réu, valores sociais que, apesar da idade, parece ter não aprendido ou ignorado. De qualquer forma deve passar pelo aprendizado.

 

As pessoas devem aprender que a truculência, a ofensa e o crime não são caminhos para se resolver absolutamente nada, ao contrário, tais atos expõem a falta de cultura de quem ofende e a sua falta de razões, insuflando os ânimos.

 

O réu deve aprender o que parece não ter aprendido ainda, que existem regras para se viver em sociedade, bem como existem regras para se discutir algum direito.

 

Em termos de valor, levando em conta a gravidade, extensão do dano e as funções da indenização, que seu valor mínimo seja arbitrado no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), pois o autor entende que esse seria o valor mínimo, para ser justo e proporcional às ofensas sofridas, como ao final se requer[7].

 

 

3. Da necessidade da concessão de tutela de urgência em caráter liminar em relação ao pedido de obrigação de fazer

 

 

Não se pode olvidar que obrigar o réu a apagar a pichação é medida que é de rigor, pois mesmo com uma tentativa de se apagar de um morador, todos os caracteres se mostram legíveis, bastando apenas um pouco mais de atenção.

 

Diante do suporte fático, legal e probatório ora apresentado, torna inafastável o dever jurisdicional de fazer cessar a ofensa, em vista do pedido veiculado ao final, no sentido que o réu seja condenado a apagar os dizeres que escreveu com tinta em um muro em frente ao condomínio onde reside o autor.

 

In casu temos que a probabilidade de sucesso dos pedidos desta petição inicial é imensa, pois as ofensas já estão provadas por meio de fotos, vídeo e imagens, que não deixam dúvida quanto ao que está alegado nesta ação.

 

A identificação do autor ainda se dá nas fotos tiradas por morador do Condomínio, o mesmo que fez a postagem na rede social Facebook, pois ele aparece aparentemente filmando ou fotografando o que fez.

 

Aguardar a prolatação da Sentença definitiva de mérito seria não só manter as ofensas permanente e indefinidamente, o que é desproporcional.

 

Qualquer que seja a defesa apresentada pelo réu não possui o condão de fazer com que mantenha a pichação, motivo que faz obrigatória a tutela de urgência.

 

Deixar alguém sendo humilhado, de forma comprovada e permanente é situação que não se coaduna com o sistema de proteção dos direitos da personalidade.

 

Com efeito, a decisão de concessão da tutela de urgência não teria a mínima chance de reversão, pois frente à legislação invocada e às provas produzidas ab initio, estão provados cabalmente os fatos alegados.

 

O autor cumpriu integralmente seu encargo de provar o alegado e ainda pretende fazer a prova testemunhal, para que a realidade se ponha à mostra, nos autos.

 

Com essas garantias e necessidades demonstradas, tem lugar a aplicação do artigo 300 do Código de processo civil, cuja transcrição segue abaixo:

 

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

 

§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

 

§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

 

§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.”

 

É necessário asseverar que o caso dispensa a caução prevista no parágrafo primeiro do artigo 300 do Código de processo civil, tendo em vista que o pedido de antecipação de tutela consistente na obrigação do réu em apagar a pichação envolve apenas o uso de uma lixa e não possui valor econômico que se possa considerar relevante.

 

O autor necessita e demonstra interesse processual que a decisão de concessão da tutela de urgência seja deferida liminarmente, sem a oitiva da parte contrária, de forma inaudita altera pars, uma vez que a manutenção da pichação seria algo teratológico.

 

Esses motivos fundamentam o pedido de tutela de urgência em caráter liminar, que segue feito no tópico final.

 

 

4. Da necessidade da expedição de ofício

 

 

A lei municipal nº 16.612/2.017 (Doc.j.), em seu artigo 4º, prevê a pena administrativa de multa, para pichações.

 

Aqui temos aprova cabal da pichação feita pelo réu, bem como serão produzidas mais provas a respeito, o que restará demonstrado ao final, que houve a transgressão à norma do artigo 4º da Lei Municipal nº 16.612/2.017, o que se verifica em seu próprio teor, abaixo transcrito:

 

Art. 4º O ato de pichação constitui infração administrativa passível de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), independentemente das sanções penais cabíveis e da obrigação de indenizar os danos de ordem material e moral porventura ocasionados.”

 

Essa situação, após provada, exige que seja oficiada a Prefeitura do Município de São Paulo, a fim de impor a sanção prevista em lei para o ato praticado pelo ré, como se requer ao final.

 

 

5. As provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados

 

 

Embora o autor já tenha juntado provas suficientes para a condenação do réu, as quais se tratam de fotografias, imagens e filmagem, pretende produzir mais provas acerca dos fatos ocorridos.

 

Inicialmente requer-se o recebimento das provas juntadas e em especial do link fornecido para o vídeo da pichação, considerando-as como provas já produzidas.

 

Além disso, pretende o autor que seja requerida a filmagem relativa ao dia dos fatos, para o Condomínio “Nome do Condomínio”, que possui sistema de câmeras, para provar inequivocamente que o autor praticou os delitos aqui denunciados e a oitiva de testemunhas, para demonstrar a repercussão dos fatos no condomínio, motivo que faz com que desde já fique requerida a produção dessas provas.

 

 

6. Do deferimento da apresentação do arquivo de gravação telefônica em Cartório

 

 

Em vista que o autor gravou em vídeo o texto da pichação, pois não foi possível registrar a pichação por foto e, devido ao fato que o processo judicial eletrônico do Tribunal de Justiça de São Paulo não comporta a juntada eletrônica de arquivos de vídeo, se faz necessário produzir tal prova, nos termos da lei.

 

Por tais razões, a Lei nº Lei 11.419/06 autoriza a juntada de documentos que tenham a digitalização inviável por sua natureza ou por impossibilidades do sistema do processo eletrônico, diretamente no Cartório.

Vejamos o autorizativo legal:

“Art. 11.  [...]

§ 5o Os documentos cuja digitalização seja tecnicamente inviável devido ao grande volume ou por motivo de ilegibilidade deverão ser apresentados ao cartório ou secretaria no prazo de 10 (dez) dias contados do envio de petição eletrônica comunicando o fato, os quais serão devolvidos à parte após o trânsito em julgado.

Assim, devido ao fato que tal situação é nova e a legislação invocada não aborda, de forma específica, o assunto referente à forma de juntada de arquivos de vídeo, invoca-se o instituto jurídico da analogia, uma vez que o arquivo de vídeo é notoriamente incompatível com o atual sistema do PJ-e e, por isso, demanda sua apresentação em mídia do tipo CD (compact disc), diretamente ao Cartório desse E. Juizado, na forma da legislação invocada.

Por tais razões, para que essa situação seja tratada com a segurança jurídico-processual adequada, requer-se a Vossa Excelência que autorize a juntada do arquivo de áudio que o autor tem a apresentar, em CD, diretamente ao escrivão Diretor do Juizado, no prazo de 10 (dez) dias, contados do ajuizamento desta ação.

 

 

7. Considerações finais

 

 

Vemos agora, que o autor foi vitimado por uma situação absurda, cuja gravidade se mede pela origem criminosa.

 

O réu se mostrou pessoa que parece contar com a impunidade para fazer valer suas vontades, mas o Poder Judiciário deve lembrá-lo que estamos sob a égide de leis que impõem deveres e obrigações que devem ser cumpridos.

 

Praticar crimes e ofensas públicas não são condutas permitidas e se praticadas, as consequências são garantidas no ordenamento jurídico pátrio.

 

Aqui temos um caso clássico de ofensas puníveis, de acordo com as regras já explanadas e que merecem o devido tratamento jurídico.

 

Não se pode permitir mais nem um dia que as ofensas fiquem incólumes, tampouco que o réu se livre de pagar uma indenização ao final do processo, haja vista que os fatos restam provados desde já.

 

A procedência da ação é de rigor em seus dois pedidos principais (obrigação de fazer e indenização por dano moral), o que se quer com veemência no tópico final a seguir.

                           

 

8. Dos pedidos

 

 

Ante o exposto requer o autor:

 

a) que seja concedida a tutela de urgência em caráter liminar e inaudita altera pars, para que o réu seja obrigado a limpar a pichação que praticou em muro em frente ao Condomínio (Nome do Condomínio), situado na (Endereço do condomínio) e retratada nas provas, de modo a eliminar por meio de lixas ou qualquer outro meio eficiente, todos os vestígios dos dizeres que ilicitamente imprimiu com tinta spray, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) por dia cumulada com a responsabilização por crime de desobediência, nos termos do artigo 330 do Código penal;

 

b) Que seja autorizado o autor a apresentar, no prazo de 10 (dez) dias, cópia do arquivo de vídeo em CD, que demonstra a situação atual do texto da pichação, ao Diretor deste E. Juizado Especial Cível, em razão da impossibilidade da apresentação de arquivos de vídeo sistema do processo eletrônico, com fundamento no parágrafo 5º da Lei 11.419/06[8];

 

c) que o réu seja citado, com as advertências legais, para, se o caso, oferecer resposta no prazo legal, sob pena de revelia;

 

d) que seja requisitado com urgência ao Condomínio (Nome do Condomínio), cópia da filmagem da pichação ocorrida aos 00/00/0000 no período entre 10h00min e 11h00min da manhã;

 

e) que seja deferida proteção policial ao autor, nas audiências do processo, tendo em vista as ameaças que o réu fez e demonstradas nas provas ora anexadas;

 

f) a total procedência da ação para, confirmando ou não a tutela de urgência requerida, condenar o réu a (i) apagar/remover a pichação criminosa e ofensiva ao autor, que fez em frente ao (Nome e endereço do Condomínio onde reside o autor), sob pena de multa diária e imputação de crime de desobediência e (ii) também que o réu seja condenado ao pagamento de uma indenização não inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), ante a gravidade e repercussão das ofensas proferidas em desfavor do autor em seu meio social;

 

g) que seja Oficiada a Prefeitura do Município de São Paulo, informando a pichação aqui noticiada, a fim de apurar a infração administrativa do artigo 4º, da Lei Municipal nº 12.612/2.017;

 

h) que o réu seja condenado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, na forma da Lei;

 

i) a regular intimação das testemunhas constantes do rol abaixo, para comparecerem à audiência de instrução, debates e julgamento;

 

j) Que não seja realizada audiência de tentativa de conciliação, uma vez que o autor está convicto que pretende ver o presente processo julgado, haja vista que quer ver uma Sentença a respeito dos fatos alegados, para sua satisfação moral;

 

k) O direito de provar o alegado por todos os meios legalmente possíveis e pertinentes ao processo, notadamente pelo depoimento pessoal do réu, apresentação de documentos novos, oitiva de testemunhas cujo rol segue abaixo, expedição de ofícios, requisições, perícias, vistorias e quaisquer outras que se mostrem necessárias para provar as alegações aqui apresentadas.

 

Dá-se à causa, o valor de R$ 20.000,00 (Vinte mil reais), para os fins de direito.

 

Nestes termos,

 

P. deferimento.

 

São Paulo, abril de 2.020.

 

 

ÉRICO T. B. OLIVIERI

OAB/SP 184.337

ADVOGADO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

https://ericoolivieri.jusbrasil.com.br



[1] Lei nº 9.605 de 12 de Fevereiro de 1998 - Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. [...] “Art. 65. Pichar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.”

[2] Código penal – “Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.” Código Penal – “Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.”

[3] Código penal – “Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.”

[4] Código penal – “Art. 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.”

[5] FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 10 ed. São Paulo : Atlas, 2012, p. 19.

[6] Código civil - “Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.”

[7] Código civil - “Art. 953. A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido.”

[8] Lei 11.419/06 - Art. 11.  [...] § 5o  Os documentos cuja digitalização seja tecnicamente inviável devido ao grande volume ou por motivo de ilegibilidade deverão ser apresentados ao cartório ou secretaria no prazo de 10 (dez) dias contados do envio de petição eletrônica comunicando o fato, os quais serão devolvidos à parte após o trânsito em julgado.

 

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