Ao Juízo de Direito da 00ª Vara do Juizado
Especial Cível da Comarca de [Cidade] – Estado de São Paulo.
Processo
nº 0000000-00.2019.8.26.0000
[Nome dos
autores], autores já qualificados nos autos do
feito em epígrafe, que tramita por essa E. Vara e respectivo Ofício, que movem
em desfavor de [Nome do requerido],
réu também qualificado, por meio de seu advogado infra-assinado, vem,
respeitosamente à presença de Vossa Excelência, para, com fulcro nos artigo 41
da Lei nº 9.099/95 e pelo fato de não se conformar com a r. Sentença definitiva
de mérito prolatada por Vossa Excelência, propor RECURSO INOMINADO, o que faz consoante as razões recursais ora
anexadas.
Ante ao exposto, requer-se o
processamento, recebimento e envio dos autos ao Colégio Recursal, para novo
julgamento, nos termos da Lei.
Nestes termos,
P. deferimento.
São Paulo, dia/mês/ano
ÉRICO T. B.
OLIVIERI
OAB/SP
184.337
ADVOGADO
RAZÕES
DE RECURSO INOMINADO
Apelante:
Apelado:
Processo de origem:
EGRÉGIO
COLÉRGIO RECURSAL!
COLENDA
TURMA JULGADORA!
ÍNCLITOS
JULGADORES!
O presente recurso inominado é
interposto, haja vista que os recorrentes entendem que a r. Sentença definitiva
de mérito prolatada em primeiro grau de jurisdição deva ser reformada, em vista
que, s.m.j., ofende o Código de Defesa do Consumidor, bem como os princípios
constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade, dentre outros, razão
pela qual requer-se o processamento, recebimento e conhecimento do presente
recurso, por não só atender aos requisitos legais, mas porque é justo em
relação à aplicação da lei.
Por tais razões, ao final, o presente
recurso deve ser julgado totalmente procedente, conforme resta demonstrado nas
razões recursais abaixo expendidas e conforme requerido no pedido.
1. Dos fatos do processo
Em breve suma, os recorrentes
demonstrarão os fatos do processo que interessam ao julgamento deste recurso,
de forma a se fazer entender e indicar os motivos do direito invocado e os
motivos de sua procedência.
Os apelantes foram contrataram
seguro-saúde no dia 30/08/1.994, conforme a apólice que consta dos autos (fls.
00), que consistia na prestação de seguro-saúde no sistema de reembolso de
despesas médico-hospitalares.
A apólice foi mantida com os
pagamentos em dia por mais de 23 (vinte
e três) anos e, em julho de 2.018, o recorrente teve problemas financeiros
originados por complicações de saúde em vista que vinha de um tratamento de um
câncer na bexiga urinária, diagnosticado no ano de 2.013, e acabou por atrasar
o pagamento da mensalidade.
Os recorrentes conseguiram acertar as
parcela seguintes, mas nos meses de dezembro de 2.018, fevereiro e março de
2.019 não conseguiram efetuar o pagamento, razão pela qual, foi enviada pelo
réu, uma notificação que o contrato seria cancelado caso a inadimplência
atingisse noventa dias.
Destaca-se que o recorrente, como
consta do comprovante ora anexado, foi cobrado e pagou a parcela do mês de
janeiro de 2.019, a qual foi cobrada novamente.
O recorrente chegou a solicitar uma
forma de colocar em dias as parcelas e não tendo obtido resposta, procurou
pessoalmente obter informações a respeito de como colocar em dia as parcelas, o
que ocorreu no dia 05 e 08/04/2019, mas os boletos para pagamento não
encontravam-se mais disponíveis no sistema do requerido para que pudessem ser
pagos.
Por isso, no dia 09 de abril de
2.019, o autor fez pedido de reativação do seguro-saúde, contudo, o requerido
respondeu formalmente comunicando a impossibilidade do atendimento à
solicitação expressa do recorrente, com fundamento o item 12.3 da apólice, que
prevê o cancelamento por atraso no pagamento de parcelas mensais por período
superior a 90 (noventa) dias.
Defendendo a falta de
notificação prevista no artigo 13 da Lei nº 9.656/98, a desproporcionalidade no
cancelamento da apólice, a extensão dos danos causados e a repetição do
indébito, além do pedido de inversão do encargo probatório, os recorrentes
ajuizaram a presente ação.
Após regular
contestação, o Juízo de primeiro grau de jurisdição resolver por bem julgar
improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, conforme vemos na
transcrição da r. Sentença:
“[...] No mérito, os pedidos são
improcedentes.
De início, destaco a incidência à
hipótese fática descrita nos autos do Código de Defesa do Consumidor. Isso
porque, com a celebração de plano de assistência médica e hospitalar, as partes
se envolveram em típica relação de consumo, conforme preceituam os artigos 2º e
3º do Código de Defesa do Consumidor. Sobre o tema, friso que o C. Superior
Tribunal de Justiça editou a Súmula 608, dispondo que: "Aplica-se o Código
de Defesa do Consumidor aos contratos firmados de plano de saúde, salvo os
administrados por entidades de autogestão".
Ademais, leciona o E. Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, pela Súmula 100: “O contrato de plano/seguro
saúde submete-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor e da Lei n.º
9.656/98, ainda que a avença tenha sido celebrada antes da vigência desses
diplomas legais”. Desta forma, aplicável a inversão do ônus probatório, desde
que apresentados elementos de verossimilhança pela parte consumidora.
Contudo, mesmo sob tal ótica, ficou
incontroversa a inadimplência dos autores em relação às mensalidades vencidas
em julho e dezembro de 2018 (que não foram pagas até o presente momento) e janeiro
de 2019 (vencida em 10/01/2019, mas paga somente em 28/02/2019, fl. 141),
resultando em inadimplência superior a 60 dias.
Ademais, não obstante a alegação dos
requerentes quanto à ausência de notificação pessoal a respeito da dívida e
possibilidade de rescisão do contrato, nada há a elidir a regularidade do aviso
de recebimento fl. 162, uma vez que o ofício de notificação foi juntado pelos
próprios autores (fl. 17), denotando seu conhecimento sobre os débitos.
Ademais, quanto ao prazo de prévia
notificação, saliento que a Lei nº 9.656/98 determina, na prática, que seja
realizada com mínimo de 10 dias de antecedência (até o 50º dia de
inadimplência, com possibilidade de cancelamento do plano a partir do 60º dia
de atraso), ao passo no que no caso em apreço, a notificação teria ocorrido
após o 65º dia de atraso, porém com mais de 10 dias de antecedência, já que o
contrato apenas foi resolvido após 90 dias de atraso. Vê-se, portanto, que a
extensão do prazo pela ré acabou por beneficiar os requerentes, pois mantida a
cobertura do seguro por prazo superior àquele previsto em lei.
Sob tal entendimento, não obstante os
requerentes tenham contribuído por mais de duas décadas à seguradora, ante sua
inadimplência, era mesmo possível a resolução pela requerida, de modo que não é
possível obrigá-la ao restabelecimento do plano.
Pelo mesmo raciocínio, considerando
que a mensalidade vencida em janeiro de 2019 foi paga com atraso,
posteriormente à emissão de notificação pela ré, não vislumbro a ocorrência de
qualquer cobrança indevida, sobretudo na hipótese em que a cobertura estava
vigente no período, conforme indicado pelos exames realizados em janeiro de
2019. Deste modo, incabível a restituição de valores.
Por conseguinte, não obstante o autor
Mário necessite de acompanhamento médico (fl. 29), não há se exigir da ré a
manutenção ou restabelecimento de plano de saúde sem que os beneficiários
arquem com os respectivos valores, sob pena de enriquecimento ilícito.
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES
OS PEDIDOS formulados por [Nome dos autores], extinguindo o feito com
fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil. Isenção de custas e de
honorários advocatícios nessa fase, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95.
Eventual recurso deverá ser
interposto no prazo de dez dias úteis, contados da ciência da sentença,
acompanhado das razões e do pedido do recorrente, que deverá efetuar, nas
quarenta e oito seguintes à interposição, o preparo do recurso, sob pena de
deserção. O valor do preparo deve ser a soma de 1% (um por cento) do valor da
causa ou cinco UFESP, o que for maior, mais 4% (quatro por cento) do total da
condenação ou cinco UFESP, o que for maior, incluindo ainda as despesas
dispensadas em primeiro grau de jurisdição, na forma do artigo 42 e 54,
parágrafo único, ambos da Lei nº 9.099/95, ressalvada eventual gratuidade da
justiça deferida à parte recorrente.
Transitada em julgado, arquivem-se os
autos, com as anotações de praxe.
P.I.”
Desta forma e não concordando com os
respeitáveis argumentos do Sentença de primeiro grau de jurisdição, interpõem
os recorrentes o presente recurso, para, que de acordo com a fundamentação a
seguir exposta e o pedido feito ao final, que seja julgado totalmente
procedente.
2. Do
direito
2.1. Da incongruência
da r. Sentença com a regra legal insculpida no artigo 13 da Lei nº 9.656/98
Para que fique ilustrado de forma
inequívoca, segue abaixo o entendimento que fundamentou a r. Sentença ora
atacada, no que tange ao assunto específico da alegação do desrespeito do prazo
legal da notificação, vejamos:
“[...] Ademais, não obstante a
alegação dos requerentes quanto à ausência de notificação pessoal a respeito da
dívida e possibilidade de rescisão do contrato, nada há a elidir a
regularidade do aviso de recebimento fl. 162, uma vez que o ofício de notificação
foi juntado pelos próprios autores (fl. 17), denotando seu conhecimento sobre
os débitos.
Ademais, quanto ao prazo de prévia
notificação, saliento que a Lei nº 9.656/98 determina, na prática, que seja
realizada com mínimo de 10 dias de antecedência (até o 50º dia de
inadimplência, com possibilidade de cancelamento do plano a partir do 60º dia
de atraso), ao passo no que no caso em apreço, a notificação teria ocorrido
após o 65º dia de atraso, porém com mais de 10 dias de antecedência, já que o
contrato apenas foi resolvido após 90 dias de atraso. Vê-se, portanto, que a
extensão do prazo pela ré acabou por beneficiar os requerentes, pois mantida a
cobertura do seguro por prazo superior àquele previsto em lei. [...] (grifo
nosso)
No que tange ao primeiro argumento
trazido pela r. Sentença, sobre o fato que foi regular a notificação,
demonstrando o conhecimento dos débitos aos recorrentes, fica totalmente
impugnado, tendo em vista que nada tem a ver com a transgressão ao artigo 13 da
Lei 8.656/98, apontada na petição inicial.
Para que fique melhor ilustrado,
vejamos a regra legal em destaque:
“Lei nº 9.656/98 - Art. 13. Os
contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei
têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência,
não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação.
(Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001)
Parágrafo único. Os produtos de que
trata o caput, contratados individualmente, terão vigência mínima de um ano,
sendo vedadas:
I - a recontagem de carências;
II - a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato,
salvo por fraude ou não-pagamento
da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos
últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o
quinquagésimo dia de inadimplência; e
III - a suspensão ou a rescisão
unilateral do contrato, em qualquer hipótese, durante a ocorrência de internação do titular.” (grifos
de destaque)
É bem nítido que a regra legal
considera irregular uma notificação
que tenha sido enviada após o quinquagésimo dia de inadimplência e isso
é fato provado nos autos e reconhecido pela própria Sentença, que asseverou que
a notificação foi feita no 65º (sextagésimo) dia de atraso.
Conforme vemos no teor da notificação
enviada para o autor no dia 14 de fevereiro de 2.019, vemos que esta data
corresponde a aproximadamente 180
(cento e oitenta dias) da data do débito apontado como vencido pelo requerido,
aos 14/07/2.018, ficando impugnada a contagem de dias constante da r. Sentença,
que desconsidera apenas 65 (sessenta e cinco). (fls. 17)
Vejamos a parte da Notificação abaixo
apresentada:
Portanto e com efeito, a r. Sentença
mesmo denuncia a transgressão legal do prazo, mas a releva sob fundamentos que não estão contidos na regra ex lege e a diminui sem qualquer tipo de
esclarecimento a respeito.
O fato do cancelamento ter ocorrido
após 90 dias do atraso, pouco importa, pois
a r. Sentença considera uma regra que não existe na lei.
Se o recorrido não cancelou o plano
logo no 61º (sextagésimo primeiro) dia, isso não altera a situação, pois a
regra legal não comporta o “porém” trazido na Sentença ora recorrida, pois se
houve prazo maior ou menor no cancelamento da apólice, isso não faz nascer
qualquer direito à rescisão unilateral, pois a norma não pode ser mitigada
quando estamos discutindo, no plano de fundo, o direito à vida, uma norma de ordem pública e a proteção de
hipossuficientes.
A hipossuficiência dos recorrentes
possui diversas vertentes, pois são idosos, consumidores e o recorrente em
especial está acometido por câncer, doença gravíssima e presumidamente
degradante.
A regra legal para a notificação foi
flagrante e expressamente reconhecida
como desobedecida na r. Sentença e é a lei que deve prevalecer, pois se
trata de um mecanismo de defesa do consumidor que é taxativo e condicional ao
obedecimento do prazo estipulado.
O espírito da lei é claro ao tornar
abusiva a rescisão unilateral
antes de certo prazo e exigir um prazo específico para notificação, e tal prazo
é nitidamente decadencial.
A r. Sentença além de afrontar o
artigo 13 da Lei 9.656/98, também fere o instituto jurídico da decadência, uma vez que o prazo
trazido no referido comando legal é peremptório quanto ao prazo de notificação.
Aqui não se defende que o débito não
deva ser pago, ou que os recorrentes devam se beneficiar ilicitamente, mas que
a regra legal seja obedecida da forma que está colocada, da forma que o
legislador pensou e expressou por meio da norma jurídica.
Também é evidente que o recorrido não
fica impedido de rescindir o contrato, mas deve fazê-lo utilizando um modelo
permitido na lei, uma vez que se não foi obedecida a regra legal, jamais
poderia ser admitida a rescisão unilateral,
mas apenas a forma judicial, através do devido processo legal, tendo em vista
que o objeto do contrato é intimamente ligado aos direitos fundamentais à vida,
à saúde e à dignidade e isso impede interpretação dada pela r. Sentença quanto
ao tema, que estendeu indevidamente a interpretação.
Nos termos da Lei, a r. Sentença
transgride o artigo 210 do Código Civil, vejamos seu teor:
“Art.
210. Deve o juiz, de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida por
lei.”
Não há a necessidade de maiores
argumentos para entender que in casu,
a decadência deveria ter sido reconhecida de plano e não afastada por uma regra
que não consta da Lei, pois o prazo em discussão para a notificação era claro.
A r. Sentença inova no tema,
permitindo uma interpretação extensiva, contrariando a regra legal e vários
institutos de direito, por via reflexa.
A regra legal, como envolve prazo, é
matemática e fatal, não poderia admitir tamanha flexibilização em desfavor de
regras legais tão claras e em desfavor de pessoas tão vulneráveis.
A jurisprudência já tratou do tema
por diversas vezes e como apresentado na petição inicial, não há como
interpretar norma de ordem pública tão clara e com parâmetro matemático, de
forma diversa, razão clara do motivo da total procedência do presente recurso
inominado.
Esses outros exemplos de julgados
demonstram a seriedade do o que está sendo alegado, vejamos:
“RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. PLANO
DE SAÚDE. INADIMPLEMENTO DE UMA PARCELA. NOTIFICAÇÃO
PRÉVIA À RESCISÃO QUE NÃO OBSERVOU O PRAZO DE ATÉ 50 DIAS DA INADIMPLÊNCIA
PREVISTO NO INC. II DO ART. 13 DA LEI Nº 9.656/98. RESCISÃO INDEVIDA.
RESTABELECIMENTO DO PLANO. DANO MORAL CONFIGURADO NA ESPÉCIE. VALOR DA INDENIZAÇÃO
REDUZIDO. JUROS DE MORA A CONTAR DA CITAÇÃO. RECURSO PROVIDO, EM PARTE.
(Recurso Cível Nº 71003949344, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais,
Relator: Roberto Behrensdorf Gomes da Silva, Julgado em 13/03/2013) (TJ-RS -
Recurso Cível: 71003949344 RS, Relator: Roberto Behrensdorf Gomes da Silva,
Data de Julgamento: 13/03/2013, Segunda Turma Recursal Cível, Data de
Publicação: Diário da Justiça do dia 18/03/2013)” (grifo nosso)
“APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL.
OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINAR
REJEITADA. DIREITO DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. ENUNCIADO Nº 608, DA SÚMULA
DO STJ. SUSPEITA DE FRAUDE. RESCISÃO UNILATERALPELA OPERADORA DO PLANO DE
SAÚDE. ART. 13, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO II, DA LEI Nº 9.656/98. ART. 17, DA
RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 195/2009, DA ANS. NOTIFICAÇÃO. PRAZO LEGAL. NÃO
OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. PACIENTE PORTADOR DE CÂNCER EM TRATAMENTO.
MANUTENÇÃO DO PLANO. 1. Não há que se falar em cerceamento de defesa, quando,
mesmo sem intimação da parte contrária, as provas juntadas posteriormente à
réplica não servirem de fundamento ao posicionamento da sentença. 2. O
Enunciado nº 608, da Súmula do STJ, é claro ao dispor que não se aplica a
legislação consumerista apenas aos contratos de plano de saúde administrados
por entidades de autogestão. Em se tratando de plano comercial de assistência à
saúde, em que as operadoras buscam auferir lucro com as contribuições vertidas
pelos participantes, devem ser aplicadas as normas disciplinadas pelo Código de
Defesa do Consumidor. 3. O art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº
9.656/98, permite a rescisão unilateral de contrato de seguro de saúde por
falta de pagamento, mas exige a
observância de dois (02) requisitos cumulativos: inadimplemento por prazo
superior a sessenta (60) dias e a comunicação da falta de pagamento ao segurado
até o quinquagésimo (50º) dia do vencimento da obrigação. 4. Os
contratos de planos privados de assistência à saúde coletiva podem ser
rescindidos imotivadamente após a vigência do período de doze (12) meses e
mediante a notificação prévia da outra parte com antecedência mínima de
sessenta (60) dias, a teor do disposto no art. 17, parágrafo único, da
Resolução nº 195/2009, da ANS. 5. Deixando a seguradora de notificar o
beneficiário com a antecedência legal mínima, a manutenção da segurado no plano
contratado é medida que se impõe. 6. Se o usuário estiver no decurso de
tratamento médico, a operadora deve aguardar a conclusão do tratamento médico
garantidor da sobrevivência e/ou incolumidade física para pôr termo à avença.
Assim, se a segurada é portadora de câncer necessitando realizar acompanhamento
médico, deve-se aguardar que cesse o tratamento para se por fim à relação
contratual, sob pena de prejudicar a sua saúde e, até mesmo, a sua própria
vida. 7. Apelo provido. (TJ-DF 20160111103472 DF 0031588-94.2016.8.07.0001,
Relator: ARNOLDO CAMANHO, Data de Julgamento: 31/07/2019, 4ª TURMA CÍVEL, Data
de Publicação: Publicado no DJE : 26/08/2019 . Pág.: 386/388) (grifo nosso)
Além de demonstrar que os recorrentes
não estão nem um pouco sozinhos na interpretação do tema, ou seja, vários
julgados lhes emprestam razão e vemos que é evidente que os dois requisitos mínimos para a rescisão unilateral não foram
obedecidos e diante disso não pode permanecer incólume a r. Sentença.
Assim, a interpretação da r. Sentença
guerreada acaba por afrontar os direitos constitucionais dos recorrentes, do
devido processo legal, do direito à vida, do direito à dignidade e tantos
outros de ordem protecionista, tanto no campo constitucional como consumerista
e civil.
Para que fique prequestionado de
forma clara e inquestionável e se demonstre previamente a repercussão geral da questão constitucional da presente
discussão, vemos que o tema é delicado, pois envolve a proteção à vida e saúde
de pessoas que estão sendo lesadas por uma interpretação anômala do instituto
legal que permite a rescisão contratual de forma unilateral pelo recorrido.
Não é demais transcrever as normas
transgredidas pela interpretação dada à r. Sentença ao artigo 13 da Lei nº
9.656/98, a saber:
“Constituição
Federal. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em
Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
III - a dignidade da pessoa humana;” (grifo
nosso)
“Constituição
Federal. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes: [...]” (grifo nosso)
“Constituição
Federal. Art. 5º [...]. LIV - ninguém será privado da liberdade ou de
seus bens sem o devido processo legal; (grifo nosso)
“Código de defesa do consumidor. Art. 4º A Política Nacional das
Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos
consumidores, o respeito à sua
dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos,
a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das
relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de
consumo; [...]” (grifo nosso)
“Código de defesa do consumidor. Art. 6º São direitos básicos do
consumidor: I - a proteção da vida,
saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no
fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
Pelo que vemos da exposição de
argumentos até agora feita, que não encontra lugar no mundo jurídico a
interpretação dada à questão do prazo legal e decadencial para a realização da
notificação que permitiria o cancelamento
unilateral da apólice, que na verdade é um seguro-saúde.
A lei, a jurisprudência e a lógica
aplicáveis à hipótese inevitavelmente levam à dedução lógica que impera na situação é que o prazo da
notificação (50 dias da inadimplência) foi transgredido e, por isso, o
cancelamento da apólice de seguro-saúde dos recorrentes não poderia ter sido rescindida
da forma que ocorreu.
Transgredindo a Lei da forma que fez,
o recorrido praticou um exercício arbitrário das próprias razões que não pode
ser homenageado pelo Poder Judiciário, ainda mais quando uma decisão judicial
se fundamenta em uma lógica que não é acolhida pelo que se pode interpretar da
semântica legal.
Finalmente, sobre o tema se assevera
que não se contesta o direito que possui o recorrido rescindir o contrato ou
não, mas a forma legal que
utilizou na hipótese para a defesa de seus direitos, pois pelo que ficou
demonstrado neste recurso, é que a forma deveria ter seguido outro rito, mais
criterioso, pela ocorrência da decadência e pela natureza dos direitos que, ao
final, são protegidos que são a vida, a saúde e a dignidade, os mais valiosos
bens jurídicos existentes.
Por tais razões, como ao final se
requer, o presente recurso deve ser julgado totalmente procedente para que
impere a regra legal que está escrita, sob pena de dar guarida a uma injustiça
que fere a lei e coloca vidas sob risco, o que é inadmissível e teratológico.
2.2. Da
ofensa aos princípios constitucionais da proporcionalidade e razoabilidade
Muito embora as transgressões de ordem
constitucional foram apresentadas no tópico anterior, uma em especial merece
uma exposição específica, tendo em vista suas particularidades.
Se trata da afronta aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade,
que fundamentam as normas constitucionais e ficará claro o motivo.
Vemos que estamos diante de um contrato que perdurou por 23 (vinte e três)
anos contra uma inadimplência de alguns poucos meses.
Não bastasse tal situação, não há como
desconsiderar para se somar a essas transgressões, o descumprimento da regra
legal do prazo da notificação, para a desproporção e falta de razão para a
cancelamento da apólice de seguro-saúde.
Dando outra dimensão à desproporção e
falta de razões, temos que os
recorrentes são idosos e o recorrente está acometido por câncer, o que
torna a r. Sentença atacada injusta, pois salta aos olhos que estamos diante de
um caso onde o recorrido agiu de
forma desleal na relação de consumo, pois não observou maliciosamente a regra
legal e o recorrente corre o risco de pagar com a própria vida ou sua saúde, o
que chama a responsabilidade do Poder Judiciário para reequilibrar a
situação na forma que a Lei impõe.
Para piorar a situação, é dos autos
que o recorrente procurou o recorrido para tentar solucionar a questão dos
pagamentos em um momento difícil que está vivendo, pois um câncer consome as
pessoas psicológica e financeiramente, ante aos cuidados especiais que a pessoa
requer e a gravidade da situação.
Se torna uma verdadeira covardia que o recorrido tenha abandonado a regra
legal para tentar se proteger, pois isso é má-fé e deslealdade na relação de
consumo, pois a regra legal que impera sobre os contratos deveria ter sido
fielmente obedecida.
Tal atitude ainda pode ser considerada
abusiva nos termos do artigo 51 do Código de defesa do consumidor, pois o
recorrido se valeu de um ato ilícito para proteger seus direitos e a r.
Sentença acabou por se tornar injusta por permitir o abandono da regra legal.
A desproporção da situação fática é
potencializada pela r. Sentença e ganha bem mais relevo diante da apresentação
de uma regra que não se pode extrair da interpretação do artigo 13, parágrafo
único e inciso II da Lei nº 9.656/98, até porque a intepretação contrária na r.
Sentença evidencia as transgressões legais já apresentadas, o que demonstra a
necessidade de sua plena reforma.
Desta feita, vemos que além de todas
as transgressões, a desproporção e a falta de razões lógico-jurídicas tornam
claramente a r. Sentença, como uma decisão que afronta os direitos vigentes dos
recorrentes, que ora são invocados, razão que deve determinar sua reforma, como
ao final é requerido.
3.
Considerações finais
Após a explanação acima, vemos que a
r. Sentença de primeiro grau de jurisdição foi injusta e ilegal, em vista a
literal criação de uma regra legal que não é perceptível no artigo 13 da Lei nº
9.656/98.
Pelos evidentes confrontos com a
legislação invocada, vemos que a r. Sentença deve ser reformada in totum, haja vista que ofende os dispositivos legais e principiológico
invocados.
Por isso, deve ser inevitavelmente
considerado, que o recorrido deveria ter adotado outra forma para atingir sua
intenção de cancelamento da apólice, que era a rescisão judicial e não unilateral, da forma que
fez, fato que resta provado nos autos e reconhecido pela r. Sentença guerreada,
o que determina sua reforma.
4. Dos
pedidos
Ante ao exposto requerem os
recorrentes:
a) O processamento, conhecimento e
julgamento do presente recurso inominado, após garantido o contraditório e a
ampla defesa no prazo legal;
b) A total procedência do presente recurso para que seja reformada
a r. Sentença, para que seja
restabelecida a apólice de seguro-saúde dos recorrentes, nos termos da
argumentação apresentada e do pedido feito na petição inicial;
c) A condenação do recorrido nas
custas processuais e honorários advocatícios;
d) Finalmente, que Vossas Excelências enfrentem
a alegação das transgressões de ordem constitucional invocadas.
Nestes termos,
P. deferimento.
São Paulo, dia/mês/ano.
ÉRICO T. B. OLIVIERI
OAB/SP 184.337
ADVOGADO
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