terça-feira, 5 de abril de 2022

[Modelo] Recurso de multa de trânsito

Ilustríssimo Senhor Presidente da Junta Administrativa de Recursos de Infrações do Departamento de Sistema Viário do Município de São Paulo – DSV/SP.


 

 

[Nome e qualificação do recorrente], vem, respeitosamente à presença de V. Sa., por intermédio de seu advogado, para, inconformado com o Auto de Infração de Trânsito nº HR-A3-000000-0, interpor Recurso Administrativo, visando sua anulação, o que faz segundo os elementos de fato e argumentos de direito abaixo aduzidos: 

1. Dos fatos.

A recorrente, no dia 31/01/2018, às 09h05min, conduzia o veículo Logan, placas AAA 0000 – São Paulo/SP, quando, no cruzamento da Av. Salim Farah Maluf com a Av. Vila Ema, foi autuado com base no artigo 187, inciso I, do Código de Trânsito Brasileiro, por supostamente “Transitar em local/horário não permitido pela regulamentação – Rodízio”[1]

Note-se, que a autuação foi feita por meio eletrônico - Radar, sem que, na via onde estava instado o respectivo instrumento de aferição de velocidade, houvesse sinalização correta que informasse ao recorrente, onde era o limite da zona de rodízio.

Várias razões são suficientes para concluir-se que o A.I.T. ora atacado, é inconsistente e não pode ser considerado válido segundo as regras preconizadas pelo Código de Trânsito Brasileiro, conforme articuladamente abaixo se expõe.

2. Da insubsistência explícita do auto de infração.

Conforme a regra insculpida no Código de Trânsito Brasileiro, antes da aplicação da penalidade de trânsito, a autoridade competente deve avaliar a consistência e a regularidade do auto de infração.

Dessa regra ex lege, extrai-se que a infração só pode der aplicada após o julgamento da existência dos requisitos formais que emprestam validade ao auto de infração, o que se confirma pela simples leitura do caput do artigo 281 do Código de Trânsito Brasileiro abaixo transcrito:


“Art. 281. A autoridade de trânsito, na esfera da competência estabelecida neste Código e dentro de sua circunscrição, julgará a consistência do auto de infração e aplicará a penalidade cabível.”

 

O ato administrativo em comento é vinculado à regra legal acima, portanto é dever legal da autoridade administrativa verificar e julgar a legalidade do auto de infração, por meio de processo administrativo.

 

Nota-se, primeiramente, que o auto de infração atacado trata-se de uma penalidade já imposta, pois se houve a notificação da infração, presume-se o julgamento de sua consistência[2], nos moldes do artigo 281 do CTB, acima citado.

 

Contudo, não consta da notificação da autuação, a menção da existência de qualquer processo administrativo com o condão da verificação da consistência do auto de infração pela autoridade competente, o que já torna o auto de infração um ato nulo de pleno direito.

 

Não bastasse a ilegalidade da inexistência de processo administrativo preliminar de verificação da consistência do A.I.T., outra ilegalidade vicia a autuação, posto que há evidente falta do preenchimento de requisito legal, que sustente a penalidade.

 

3. Da falta de sinalização adequada – nulidade da aplicação da penalidade.

 

Por simples leitura, depreende-se da notificação da autuação de infração de trânsito, que o suposto ilícito de trânsito apontado na notificação se refere a um suposto desrespeito ao rodízio de veículos imposto pelo Município de São Paulo, portanto, tal aferição deve obedecer as regras impostas na legislação federal vigente, para que se sustente no ponto de vista jurídico.

 

O recorrente transitou no dia dos fatos, vindo pela Av. Professor Luís Inácio de Anhaia Melo, sentido bairro-centro, adentrando na Av. Salim Farah Maluf, pela alça de acesso da Praça Maria do Nascimento Silva, conforme ilustra o mapa abaixo:

 


Na imagem abaixo, fica claro a imagem do acesso e a sinalização existente no local do acesso à Av. Salim Farah Maluf:


 

Mais à frente a imagem é a seguinte:

 

No exato ponto onde o recorrente adentrou na Av. Salim Farah Maluf, vemos a seguinte imagem: 


 

No primeiro cruzamento à frente, onde está o radar que acusou a infração ora recorrida, ou seja, cruzamento das Avenidas Salim Farah Maluf e Vila Ema é a situação:

 


O recorrente, sabendo que era dia de rodízio municipal e que seu carro estava proibido de adentrar na zona de rodízio, por não ter placas, pensou que não estava em zona de proibição do trânsito para aquele dia e horário, mas mesmo assim, saiu da zona do Rodízio municipal, pela Praça Rolim de Moura, caminho que podemos ver na imagem abaixo:

 



Esse caminho foi feito para que o recorrente pudesse chegar ao Fórum Trabalhista da Zona Leste de São Paulo, onde tinha uma audiência judicial agendada (Doc.j.), pois era reclamante em uma ação trabalhista (Doc.j.), e todo o trajeto daí em diante se deu em zona livre da proibição.

A figura abaixo demonstra que o recorrente andou na zona limítrofe do rodízio por um curto espaço, estimado em 200 metros, vejamos:

 




Tal transgressão ocorreu, de fato, pois como se verifica em todas as imagens apresentadas, que não existe uma placa sequer indicando que ali se iniciava a zona geográfica do rodízio, ou seja, na saída da Av. Prof. Luís Ignácio de Anhaia Melo (Sentido bairro-centro), pela Praça Maria da Penha Nascimento Silva, em direção à Av. Salim Farah Maluf.

Além do percurso insignificante que o recorrente percorreu no limite geográfico da zona de proibição, logo saindo para uma zona livre de trânsito, não se deparou com qualquer sinalização que naquele local se iniciava ou terminava a zona de rodízio.

O recorrente realmente pensava que naquele local não havia proibição, tanto que escolheu ir até ali e mudou o trajeto de seu destino e percorreu uma zona livre de trânsito.

A sinalização existente na Av. Salim Farah Maluf, na altura da Praça Florestan Fernandes bem mais à frente, possui sinalização indicando o início do rodízio, razão pela qual o recorrente foi induzido a pensar que a proibição era a partir desse ponto, vejamos as imagens:

 



Segundo o princípio da informação permanente, vigente no direito de trânsito brasileiro, que é instrumentalizado no caso do Rodízio Municipal, com a instalação de placa informativa em toda a zona limítrofe, ou seja em todos os acessos, no caso foi desrespeitado.

 As imagens são claras, e vemos que o Poder Público se preocupou em fiscalizar mas não em informar.

A situação ora narrada é uma verdadeira armadilha, pois sem saber exatamente onde termina ou onde se inicia a zona de proibição, só se pode pensar em uma indústria bem instalada de multas de trânsito.

Observa-se que, ainda que a lei preveja expressamente infração por transitar em locais e horários não permitidos, esta infração está sujeita a Regulamentação, o que não ocorreu no presente caso, ou mesmo se ocorreu, a sinalização competente não foi instalada no local.

Deste modo, no rodízio de veículos o órgão competente de trânsito é obrigado a implantar placa de sinalização, com as devidas informações necessárias a regulamentação da restrição de circulação veicular, com o objetivo de se legitimar o disposto na legislação que implantou o citado rodízio.

Assim dispõe o artigo 90 do Código de Trânsito Brasileiro:

Art. 90. Não serão aplicadas as sanções previstas neste Código por inobservância à sinalização quando esta for insuficiente ou incorreta.

Sendo assim, no caso concreto, não há o que se falar em imputar multa ao recorrente, uma vez que em nenhum momento este se deparou com qualquer sinalização que o instruísse de forma correta e, pela existência de sinalização de início em outro local, foi induzido ao erro.

Ainda, importa frisar que os atos administrativos, para que sejam válidos, devem obedecer o princípio constitucional da legalidade, devendo seguir estritamente a forma prescrita na lei.

Sobre o assunto, a jurisprudência vem decidindo de forma favorável ao que se requer no presente recurso:

“Anulatória. Multa de trânsito. Penalização por estacionamento em local proibido. Ausência de sinalização. Indenização por danos morais e materiais. Impõe-se a anulação de sanção aplicada pela administração, quando demonstrada a ausência de sinalização na via em que o motorista foi autuado por estacionar em local proibido. Comprovados os requisitos da responsabilização estatal do tipo objetiva, impõe-se o pagamento de indenização por danos morais e materiais àquele que foi penalizado indevidamente. (TJ-RO - APL: 00109676920108220001 RO 0010967-69.2010.822.0001, Relator: Desembargador Eurico Montenegro, Data de Julgamento: 09/02/2012, 1ª Câmara Especial, Data de Publicação: Processo publicado no Diário Oficial em 14/02/2012.)

Por oportuno vejamos o conceito, constante do Anexo I do Código de Transito Brasileiro para a expressão “regulamentação da via”: 

“implantação de sinalização de regulamentação pelo órgão ou entidade competente com circunscrição sobre a via, definindo, entre outros, sentido de direção, tipo de estacionamento, horários e dias”.  

Portanto, verifica-se que no rodízio de veículos vigente em são Paulo, o órgão competente de trânsito, nos termos da Resolução CONTRAN 180/05, está obrigado a implantar a placa de sinalização denominada R-10, com as devidas informações adicionais necessárias a regulamentação da restrição de circulação veicular, com o objetivo de se legitimar o disposto na legislação que implantou o citado rodízio. 

A respeito do tema, cumpre salientar o estabelecido na mencionada resolução, a qual aprovou o Volume I do Manual Brasileiro de Sinalização de Trânsito, com as regras de instalação e interpretação para toda a Sinalização vertical de regulamentação:  

“Sinal: Proibido trânsito de veículos automotores R-10.

Significado: Assinala ao condutor de qualquer veículo automotor a proibição de transitar, a partir do ponto sinalizado, na área ou via/pista ou faixa.

Princípios de utilização: O sinal R-10 deve ser utilizado em área, via/pista ou faixa para proibir o trânsito de veículos automotores.

Quando utilizado para regulamentar a proibição em determinada(s) faixa(s) deve vir acompanhado de informação complementar. 

Pode ser utilizado associado a informação complementar “EXCETO...”, ou “PERMITIDO...”, liberando o trânsito a determinada espécie ou categoria de veículo ou ainda outras informações complementares tais como horário, dia da semana e/ou seta de controle de faixa.

O sinal R-10 tem validade a partir do ponto onde é colocado.

Posicionamento na via: A placa deve ser colocada no início do trecho da restrição, à direita ou à esquerda ou em ambos os lados, conforme o caso.

...

Relacionamento com outras sinalizações: O sinal R-10 pode ser antecedido de sinalização especial de advertência informando sobre a restrição à frente e/ou placa de orientação indicando rotas alternativas.

Enquadramento: O desrespeito ao sinal R-10 caracteriza infração prevista no art. 187, inciso I, do CTB.” 


Assim sendo, verifica-se que norma do CONTRAN exige a existência da placa R-10 para informar, orientar e advertir o condutor acerca da restrição de circulação em determinados locais e horários imposta pela municipalidade, só assim poderá se configurar a infração do artigo 187, inciso I, do CTB. 

Portanto, a ausência da sinalização obrigatória, implica na impossibilidade de autuação do condutor, com base no artigo 187, inciso I, do CTB, face ao disposto no artigo 90 da mesma codificação o qual estabelece que Não serão aplicadas as sanções previstas neste Código por inobservância à sinalização quando esta for insuficiente ou incorreta”. 

 Ademais, ressalta-se que os atos administrativos para terem total validade devem estar revestidos do princípio da legalidade, instituído no artigo 37 da Constituição Federal, ou seja, deve seguir estritamente a forma prescrita em lei. 

Por fim, há de se observar que o Poder Judiciário já se manifestou a respeito tema em questão, abraçando a tese aqui ventilada, ao conceder liminar em ação civil pública, em tramite perante a 10ª Vara da Fazenda Pública (processo nº 583.53.2007.108594-1), ou seja:

 “...Nesse contexto, é de se ter em conta que malgrado o tempo já decorrido desde a implantação desse “programa de restrição ao tráfego”, em 1997, esse dever legal não pode ser olvidado ou descumprido, seja porque a Lei assim o prevê, exigindo seu efetivo cumprimento, seja porque é fato que muitas pessoas de outras cidades circulam por esta Capital e quando o fazem sujeitam-se evidentemente a esse tipo de restrição e às sanções legalmente previstas (multa e pontuação negativa em prontuário de condutor), a tornar ainda mais necessária essa sinalização de informação e advertência, sobretudo porque são várias as vias públicas atingidas em extenso perímetro urbano, o que pode causar (e certamente causa) confusão aos motoristas, mesmo àqueles que com maior freqüência transitam por esta Capital, que nem sempre podem, com clareza e segurança, identificar o que constitui territorialmente como “centro expandido...” 


Enfim, essas são as razões que impõem o total acolhimento do presente recurso, até porque o Poder Público, na situação, transgride a lei, impõe uma indústria de multas e, em especial, ofende frontalmente o artigo 37 da Constituição Federal, pois não age em obediência aos princípios da legalidade, eficiência e moralidade.

 

 

4. Da insignificância da infração e da indução em erro do recorrente

 

 

Como se vê nas imagens já apresentadas, quando o recorrente entrou na Av. Salim Farah Maluf, percorreu aproximadamente 200 metros até sair da referida Avenida, pela Praça Rolim de Moura.

 

Note Vossa Senhoria, que o recorrente não apresentou qualquer intenção de transgredir a legislação de trânsito, tampouco sabia que estava infringindo o rodízio naquele local e a falta de sinalização ainda permitiu que continuasse pensando assim.

Se o recorrente soubesse que havia transgredido a lei, trafegaria então pela Av. Salim Farah Maluf, já que seria a rota mais confortável, mas pegou o acesso da Praça Rolim de Moura, justamente porque conhecia a sinalização de solo colocada na Praça Florestan Fernandes, na Av. Salim Farah Maluf, um pouco mais à frente.

A falta de conhecimento do delito exclui o dolo, o que por via de consequência lógica, exclui do delito, tendo em vista a natureza de direito penal das sanções de trânsito.

Diante disso, além de termos uma situação onde a transgressão legal foi ínfima, bem como o fato que o recorrente estava com severo vício em sua vontade, pois desconhecia a proibição por conta da transgressão da legislação de trânsito pelo próprio Poder Público, deve o auto de infração ora guerreado, ser considerado insubsistente, inconsistente e ilegal, devendo ser cancelado na forma da lei.

4. Dos pedidos.

Face ao exposto, requer-se:

(i) Que seja recebido o presente recurso sem o pagamento da multa[3] e em todos os seus termos, pois obedecidos os requisitos do artigo 286 do C.T.B.;

(ii) Que seja dado efeito suspensivo ao auto de infração de trânsito, até o julgamento do presente recurso, caso a decisão não ocorra dentro do prazo de 30 (trinta) dias, estabelecido pelo parágrafo 3º do Artigo 285 do C.T.B.[4];

(iii) Que seja julgado totalmente procedente o presente recurso administrativo, para reconhecer a insubsistência, inconsistência e consequente nulidade do A.I.T., por ofensa ao princípio da legalidade, especificamente aos termos da Resolução 180/05, do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, por não existir no local uma placa de sinalização do tipo R-10 e demais motivos apresentados neste recurso;

(iv) Que a decisão seja devidamente fundamentada, para que a recorrente possa exercer seu direito ao contraditório e ampla defesa, garantidos pela Constituição Federal;

(v) Que seja impedida de ser registrada ou apagada dos prontuários da requerente, a pontuação gerada em seu Prontuário Geral único.

(vi) Que o recorrente seja devidamente notificado da decisão sobre o presente recurso, sob pena de nulidade.

 

Nestes termos,

 

P. deferimento.

 

São Paulo, 30 de setembro de 2.020.

 

 

 

ÉRICO T. B. OLIVIERI

OAB/SP 184.337

ADVOGADO

 

 

 



[1] CTB – “Art. 187. Transitar em locais e horários não permitidos pela regulamentação estabelecida pela autoridade competente:[...]”

 

[2] CTB - Art. 282. Aplicada a penalidade, será expedida notificação ao proprietário do veículo ou ao infrator, por remessa postal ou por qualquer outro meio tecnológico hábil, que assegure a ciência da imposição da penalidade.

[3] CTB – Art. 286. O recurso contra a imposição de multa poderá ser interposto no prazo legal, sem o recolhimento do seu valor.

 

[4] CTB – Art. 285. [...].

[...]

§ 3º Se, por motivo de força maior, o recurso não for julgado dentro do prazo previsto neste artigo, a autoridade que impôs a penalidade, de ofício, ou por solicitação do recorrente, poderá conceder-lhe efeito suspensivo.

 

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