Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente da Seção Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
“Nada mais
perigoso do que fazer-se Constituição sem o propósito de cumpri-la. Ou de só se
cumprir os princípios de que se precisa, ou se entende devam ser cumpridos – o
que é pior! (Pontes de Miranda)
[Nome e qualificação do
impetrante – geralmente o advogado], onde recebe intimações, vem, respeitosamente perante
V. Exa. e esse Egrégio Tribunal, com
fundamento no art. 5º, inc. LXVIII, da Constituição Federal e arts. 647 e 648,
II, do Código de Processo Penal, impetrar o presente:
HABEAS CORPUS
em favor de [Nome e
qualificação do paciente – quem está sofrendo restrição ilegal ao seu direito
constitucional de ir e vir] e atualmente recolhido no Centro de Detenção
Provisória de Mauá-SP, tudo pelos fatos e em razão dos fundamentos jurídicos a
seguir expostos:
O paciente foi preso em 00/00/0000, por policiais militares
em fiscalização de trânsito, em virtude de ordem de prisão preventiva, do MM.
Juízo de direito da 00ª Vara Criminal Central de São Paulo – Capital, uma vez
que pesa contra si, a acusação de ter supostamente participado do crime de
roubo qualificado por uso de arma de fogo e corrupção de menor, conforme consta
das cópias dos autos da ação penal processada perante o referido juízo de
direito, sob o nº 0000000-00.0000.8.26.0000.
Na audiência de custódia[1],
a prisão foi mantida, em vista dos elementos indiciários de de identificação da
autoria, que constavam dos autos.
A denúncia fora ofertada em 00/00/0000, sendo que na data da
prisão, o processo judicial já existia e poucos dias após à prisão, através de
advogado habilitado, foi feito o pedido de liberdade provisória, visto entender
a defesa, que o paciente fazia jus a esse direito, comprovado, outrossim, a sua
primariedade, bons antecedentes, domicílio certo e profissão definida, contudo
tal pedido foi negado, mediante parecer desfavorável do DD. Promotor Público.
Desta forma, foi designada audiência de instrução, ocorrida
em 00/00/0000, contudo, tendo em vista que por motivos desconhecidos, não
compareceu a testemunha arrolada de nome [nome da testemunha], bem como o
paciente não foi conduzido do CDP de Mauá-SP para o Fórum Criminal da Barra
Funda, em São Paulo-SP, motivo que prejudicou a realização da referida
audiência.
Em prosseguimento, o MM. Juízo de Direito da 00ª Vara Cível
designou audiência em prosseguimento da instrução, que ocorreu em 00/00/0000, contudo, nesta audiência não foram ouvidas as
testemunhas de defesa, mesmo presentes e nem mesmo ocorreu o reconhecimento
formal da vítima em relação aos acusados e tampouco o interrogatório dos réus,
inclusive do paciente, motivo que levou o referido Magistrado a designar
audiência em continuação da instrução para o dia 00/00/0000, ou seja, daqui a
aproximadamente 2 (dois) meses.
6. Assim, pelo que consta da cópia das principais partes do
processo já especificado, ora juntadas, que a prisão do acusado já ultrapassa
105 (cento e cinco) dias, perfazendo hoje o total de 106 (cento e seis) dias e
pelo que demonstra a documentação juntada, especialmente no que se refere à
continuação da instrução, a prisão, caso absurdamente mantida, perfazer
aproximadamente 6 (seis) meses, o que é inadmissível no sistema processual
penal pátrio.
Nestas condições, Excelência, temos que o prazo máximo
previsto para a realização de instrução processual encontra-se legal e
fatalmente esgotado, gerando o constrangimento
ilegal sofrido pelo paciente e objeto da presente impetração.
Na hipótese, temos ainda que considerar que tanto o
inquérito, tanto a denúncia estavam sendo computados na forma prevista para
réus soltos, contudo a partir de sua prisão, passou a influir no processo a
condição de preso do paciente.
Ademais, a sistemática
processual atual compreende o prazo do inquérito - 10 (dez) dias, do
oferecimento da denúncia - 5 (cinco) dias, a resposta - 10 (dez) dias, da
marcação de audiência - 60 (sessenta) dias – Ar. 400 CPP, ouvindo-se as partes,
testemunhas e produzindo demais provas pertinentes e requerendo-se novas
diligências, alegações finais sucessivas no prazo de 05 (cinco) dias (no caso
de requerimento de diligências – Art. 404 CPP – totalizando 10 dias) e, no caso
de requerimento de novas diligências, 10 (dez) dias para a prolação da
Sentença, o que totaliza o prazo possível e total para a instrução e julgamento
do processo, de 105 dias, contudo, mesmo se considerarmos a nova sistemática
processual e os novos prazos introduzidos pela lei 11.719, de 2008, temos que
mesmo assim, com a prova cabal de que a instrução perdurará até ao menos 00/00/0000,
não pode o paciente aguardar que a lesão se consume, para que adote as
providências judiciais que o caso requer, motivo que o leva a impetrar este
pedido de habeas corpus, pois a lesão
já está em curso, com a devida comprovação, o que demonstra estarem sendo
desrespeitados os ditames cronológicos estabelecidos pelo Código de Processo
Penal.
A infração à lei federal é literal e frontal, posto que o
artigo 648 do referido codex assim
preleciona:
“Art. 648. A coação
considerar-se-á ilegal:
I - quando não houver justa
causa;
II -
quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;”
Vemos que a sistemática atual dos prazos foi aumentada em 24
dias frente ao prazo anterior de instrução que era de 81 (oitenta e um) dias,
mas mesmo assim o Poder Judiciário não conseguiu cumprir as determinações da
Lei e frisa-se, exclusivamente por culpa do próprio Estado, que na primeira
audiência não conduziu o paciente do CDP de Mauá-SP até o Fórum Criminal da
Barra Funda por motivos desconhecidos mas sem qualquer culpa sua e na segunda,
ante à ausência da vítima e o requerimento do DD. Representante do Ministério
Público, para a oitiva do outro policial envolvido na prisão do menor que
supostamente delatou o paciente, que não havia sido arrolado na denúncia.
Note-se que as testemunhas arroladas pelo paciente
compareceram nas duas audiências, contudo não foram ouvidas, fatos que
ocorreram sem qualquer participação da defesa ou do próprio paciente.
Sobre o tema, esse Egrégio Tribunal também assim se posiciona
em casos dessa espécie:
“Processo nº
0226723-58.2012.8.26.0000 - Habeas Corpus
Relator(a): Alberto Mariz de Oliveira
Comarca: Carapicuíba
Órgão julgador: 16ª Câmara de Direito Criminal
Data do julgamento: 12/03/2013
Data de registro: 21/03/2013
Outros números: 2267235820128260000
Ementa: Habeas Corpus homicídios
qualificados consumado e tentado alegação de inocência e provas duvidosas -
questões de mérito: impossibilidade de análise no writ impetração não conhecida
- excesso de prazo verificado -
atraso que não pode ser imputado à defesa - Ordem concedida de ofício
aplicação de medidas cautelares: necessidade - extensão ao co-réu em idêntica
situação.”
Outros julgados vibram no mesmo diapasão, por analogia;
vejamos:
"A jurisprudência fixou em 81 dias o prazo para o término da
instrução criminal estando preso o acusado. Ocorrendo excesso nesse prazo sem
motivo justificado, impõe-se o relaxamento do flagrante" (Rts 526/358 e
523/375)”.
No mesmo sentido, Rts 399/68, 433/343, 420/246, 435/341,
526/362, etc.
De fato, o excesso de prazo torna a prisão ilegal e origina o
direito à liberdade do paciente, desde que tal excesso seja injustificado e que
não provenha de diligência requerida pela defesa. É o caso presente, pois o
atraso decorre de uma ineficiência do próprio Estado que acaba por atacar
profundamente, a dignidade do paciente.
Outro julgado, de maneira lúcida, apresenta exatamente a
ilegalidade que recai sobre o direito de liberdade do paciente, vejamos:
“PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS.
TRÁFICO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRISÃO PREVENTIVA.
EXCESSO DE PRAZO PARA O JULGAMENTO DA APELAÇÃO. FLAGRANTE ILEGALIDADE
CONFIGURADA. ORDEM CONCEDIDA. 1. O excesso
de prazo na segregação cautelar do paciente é inequívoco, uma vez que, preso
cautelarmente desde 28/9/2014, ainda se encontra pendente de julgamento o seu
recurso de apelação, em violação ao disposto no preceito inserto no art. 5º,
LXXVIII, da Constituição Federal. 2. Ordem concedida para relaxar a
prisão do paciente, se por outro motivo não estiver preso, sem prejuízo de que
sejam impostas medidas cautelares constantes do art. 319 do Código de Processo
Penal, caso demonstrada sua necessidade. (STJ - HC: 450970 SP 2018/0119486-2,
Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 11/09/2018, T6 - SEXTA
TURMA, Data de Publicação: DJe 08/10/2018)” (grifo intencional)
Na hipótese, se não bastasse, restam feridas também, normas
de caráter supra-constitucional, tendo em vista que a Convenção Americana de
Direitos Humanos, assegura as devidas garantias processuais dentro de um prazo
razoável[2];
a Constituição Federal, expressamente (Art. 5º, inciso LXXVIII)[3]
e por fim as normas de caráter federal já citadas e contidas no Código de
Processo Penal.
Os princípios constitucionais aqui aplicáveis demonstram que
o processo deve ser eficiente, ocorrer em prazo razoável e entregar o direito e
respeitar as garantias e contrapesos de ordem constitucional, seja ele de que
natureza for. Se de natureza penal, não se pode segregar-se sem a observância
da força dos direitos que envolvem a dignidade da pessoa.
Como a Justiça não opera com a celeridade que dela se espera,
rapidez ainda mais necessária quando se trata da liberdade de uma pessoa,
muitos terminam por cumprir integralmente suas penas antes mesmo de condenados.
O tempo de prisão cautelar dilatado é ofende toda a
sociedade, uma vez que um indivíduo que pode ser inocentado estará sofrendo
danos morais e físicos, além de perder o emprego e ficar longe da família e dos
amigos, o que poderá gerar consequências irreversíveis àquele que for
absolvido, haja vista que o tempo em que passar na prisão não lhe será
devolvido.
Uma resposta processual célere tem inúmeras vantagens. A
saber: facilita a produção (colheita) de provas, antes que elas desapareçam ou
que as testemunhas esqueçam dos fatos, aumenta a confiança da população no
Poder Judiciário, e diminui consideravelmente a sensação de impunidade, entre
outros benefícios incomensuráveis.
É indispensável uma urgente reforma legislativa para que se
estipule a duração do processo penal, tendo como ponto basilar a duração das
prisões cautelares, entrementes, sem olvidar das situações anômalas, as quais,
evidentemente, podem ocorrer. Ressalte-se que a duração do processo não pode
ser tão rápida a ponto de cercear o direito à ampla defesa, ao contraditório e
ao devido processo legal (art. 5º, LIV, CF/88).
Ademais, há de se dar relevo que a duração prolongada da
prisão provisória afronta princípios constitucionais, especialmente, o da
dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88), a presunção de inocência
(art. 5º, LVII, CF/88) e razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII,
CF/88).
É tão absurdo o que acontece na atualidade, que se pode
afirmar que o excesso de prazo para a conclusão de um processo criminal é um
verdadeiro mal da justiça humana e que se torna mais grave a cada dia.
O processo não deve durar tanto, como se vê com uma frequência
indesejada, nem tão pouco, como a regra dos 105 dias, haja vista ser necessária
uma avaliação casuística, a qual engloba o princípio da razoabilidade.
O mal reside na falta de uma lei que estabeleça claramente os
prazos e os motivos para a dilação do processo ou para a prisão cautelar. Caso
os prazos fossem fixados, evitar-se-ia este desconchavo que acontece
iterativamente.
O réu/indiciado, que está preso, tem direito público
subjetivo de ser julgado num prazo razoável e, quando configurado excesso
irrazoável na duração desta prisão, não pode permanecer exposto a tal situação
de evidente abuso, ainda que o crime supostamente praticado seja considerado
como hediondo ou a este equiparado, para que, efetivamente, haja a mais lídima
Justiça.
10. Temos ainda, que a custódia cautelar do paciente, que
está preso preventivamente por ordem do MM. Juízo da 00ª Vara Criminal Central
da Comarca de São Paulo – Capital, não se justifica, a teor do que se verifica
dos autos e das provas produzidas até o momento, pois além de ser primário e de
bons antecedentes, não participou do delito, conforme restará demonstrado
durante a instrução processual do processo já especificado.
11. Ante o exposto, que será suprido pelos doutos subsídios
dos componentes da Egrégia Câmara Criminal, espera o impetrante seja concedida,
em favor do paciente, a competente Ordem de Habeas
Corpus para fazer cessar o constrangimento ilegal que sofre o mesmo, por
ofensa aos prazos processuais estabelecidos em lei, além do fato de ter total
direito ao acompanhamento do processo em liberdade, face aos princípios da
inocência, razoabilidade, proporcionalidade, eficiência e devido processo
legal, expedindo-se, imediatamente, Alvará de Soltura, a fim de que seja o paciente
imediatamente posto em liberdade, em homenagem aos princípios que norteiam a
distribuição da Justiça!
Nestes Termos,
P. deferimento.
São Paulo, data, mês e ano.
ÉRICO T. B. OLIVIERI
OAB/SP 184.337
ADVOGADO
[1]
Resolução CNJ 213/20105 - Art. 1º
Determinar que toda pessoa presa em flagrante delito, independentemente da
motivação ou natureza do ato, seja obrigatoriamente apresentada, em até 24
horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente, e ouvida
sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão.
[2]
Convenção Americana de Direitos Humanos – Art. 8º - Toda pessoa tem direito a
ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz
ou tribunal, independente e imparcial estabelecido anteriormente por lei, na
apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se
determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal
ou de qualquer natureza.
[3]
Constituição Federal – Art. 5º inciso LXXVIII – A todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade
de sua tramitação.
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